TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

413 acórdão n.º 105/14 porém, não afasta preocupações de equidade, atendendo designadamente à natureza do direito e à duração – curta ou longa – do prazo de prescrição em questão. Referindo-se especificadamente ao direito de indemnização, em causa nos presentes autos, disse Vaz Serra: «Parece, realmente, que o princípio deve ser que o início da prescrição não é impedido pela ignorância do titular sobre a existência do direito e sobre a sua titularidade. Embora não haja então negligência do titular, ou possa não a haver, sempre há inércia da sua parte e a parte contrária não deve ficar à mercê da ignorância do titular, a qual, de resto, pode prolongar-se por muito tempo: não pode então dizer-se que a prescrição se funda numa presunção de renúncia ao direito, mas, como se viu, a razão de ser da prescrição não é só essa, intervindo também outras considerações e, entre elas, a da vantagem de segurança jurídica. Mas isto não significa que a lei deva sempre manter-se neste princípio, e não deva, antes, para os casos em que isso se mostre especialmente razoável (e que são sobretudo casos de prescrição de curto prazo), fixar, para início da prescrição, o momento em que o seu titular se acha em situação de facto que lhe permita exercer o seu direito. (...) É (...) o que se propõe para a prescrição curta do direito de indemnização (...): este direito prescreveria por três anos contados da data em que o lesado teve conhecimento desse direito e da pessoa do responsável. Funda-se na particular importância do direito de indemnização, que não parece deva prescrever sem que o seu titular tenha a possibilidade prática de o exercer. Além desta curta prescrição, parece que o direito de indemnização deve ficar sujeito à prescrição ordinária, contada da data em que o direito pode fazer-se valer, isto é, daquela em que se reúnem os requisitos da responsa- bilidade civil (...). A circunstância, porém, de se firmar o princípio de que o começo da prescrição não é impedido pela ignorância do titular acerca da existência e titularidade do direito ou por algum outro obstáculo de facto, não parece dever conduzir, sem mais nada, a que o titular deva ser sacrificado sem possibilidade de se defender. Embora se não admita, em termos amplos, a regra contra non valentem agere non currit praescriptio, sempre se afigura razoável que aquele princípio seja temperado de algum modo por esta outra regra. O problema põe-se em matéria de início da prescrição e em matéria de suspensão do curso desta, pois o impe- dimento de facto ao exercício do direito pode existir na data em que o prazo deveria começar a correr ou pode surgir só quando esse prazo está já em curso» ( ob. cit. , pp. 198 e 199). Nestes termos, a suspensão da prescrição por motivos de força maior visou dar resposta a impedimen- tos de exercício do direito à ação sobrevindos, aproximando-se, então, de institutos adjetivos, como seja o do justo impedimento, previsto no artigo 146.º do Código de Processo Civil, de 1961, em que se admite a prática do ato para além do prazo respetivo, se o juiz julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou. Regime esse que, na ausência de outras previsões e perante o caráter excecional das causas de suspensão da prescrição, a doutrina admitia no domínio do Código de Seabra como única via de atingir uma solução justa para as situações que inibem o credor de agir contra o devedor, pese embora não a mais apropriada (assim, Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica , vol. II, Coimbra, 1987, pp. 457 e 458). A solução acolhida no n.º 1 do artigo 321.º pelo legislador no Código Civil vigente veio precisamente ultrapassar a dificuldade notada pela doutrina. Contempla a suspensão do prazo de prescrição por causa objetiva derivada de situação jurídica relevante, como seja motivo de força maior (conceito oriundo do Código de Seabra e que corresponde ao de impossibilidade, acolhido em previsões aproximadas, como observa Menezes Cordeiro, in Direito Civil Português , I, Parte Geral, Tomo IV, Almedina, 2007, p. 191) que impeça titular do direito de o fazer valer nos últimos três meses do prazo de prescrição, facultando o seu exercício pelo tempo que durar tal impedimento, ou seja, por período que pode atingir, na sua expressão máxima, três meses.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=