TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

412 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do seu interesse e não faria sentido que, contra todas as expectativas criadas pela sua abstenção, o devedor fosse forçado a realizar a prestação. O exercício coativo do crédito revelar-se-ia até, em muitos casos, ver- dadeiramente chocante para a consciência jurídica” (cfr. Modos de Extinção das Obrigações, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, Vol. I, Almedina, 2012, p. 247). 8. A suspensão da prescrição supõe uma causa, subjetiva ou objetiva, que constitua obstáculo de facto ao exercício do direito, ou que o torne especialmente difícil, com expressão tal que afasta a verificação de negligência do seu titular e, então, torna injusto o curso do prazo prescricional. Sendo esse o racional, esco- lheu o legislador não estabelecer uma regra geral, conferindo efeito suspensivo a todos os eventos ou motivos que impeçam de facto, ou dificultem significativamente, o exercício do direito pelo seu titular, optando pela consagração de certas causas suspensivas da prescrição. Assim, encontra-se no ordenamento civil especificação de causas de suspensão que resultam de uma especial relação existente entre as partes ou da especial situação do titular, de alcance bilateral, como seja a relação conjugal [artigo 318.º, alínea a) ], a relação de poder paternal, tutela ou curatela [artigo 318.º, alínea b) ], a relação de administração de bens ou de pessoa coletiva [artigo 318.º, alínea c) ], a relação de trabalho doméstico [artigo 318.º, alínea d) ] ou a relação de usufruto do crédito pelo devedor ou de penhor sobre ele [artigo 318.º, alínea e) ]. Também de natureza subjetiva, mas de outra ordem, obedecendo a razões fun- damentalmente protetoras e de garantia quanto à ausência ou inércia de representante legal, encontra-se a suspensão da prescrição relativamente a menores, interditos ou inabilitados, prescrita no artigo 320.º  Por seu turno, o impedimento de exercício derivado do serviço militar, durante o tempo de guerra ou de mobi- lização, encontra acolhimento como causa de suspensão da prescrição no artigo 319.º O artigo 322.º, relativo à prescrição dos direitos da herança ou contra ela, assim como o artigo 320.º, que rege a especial condição dos menores, interditos ou inabilitados, contemplam causas de suspensão do termo da prescrição. Nessas situações, o prazo prescricional corre os seus termos, mas só se completa tempo depois de cessado o obstáculo de facto. Os prazos previstos pelo legislador situam-se em seis meses a partir da possibilidade de invocação pelo titular do direito contra à herança ou por esta contra o devedor, em um ano no caso do menor a partir do termo da incapacidade, ou do momento em que passou a ter representante legal ou administrador dos seus bens nos casos de prescrição presuntiva. O regime do menor é aplicável aos interditos e inabilitados, com a diferença de que a incapacidade se considera finda, caso não tenha cessado antes, passados três anos sobre o termo do prazo que seria aplicável se a suspensão se não houvesse verificado (n.º 3 do artigo 320.º). A especificidade das causas de suspensão do curso do prazo de prescrição, ou do seu termo, que se vêm de referir, não esgotam, porém, as situações de merecimento de proteção neste domínio, como foi salientado por Vaz Serra. A resposta a essa necessidade encontra-se precisamente no disposto no n.º 1 do artigo 321.º, completando através da cláusula geral de motivo de força maior, o elenco legal das causas suspensivas de pres- crição, que de outro modo ficaria incompleto (cfr. Prescrição extintiva e caducidade, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 106, pp. 175 a 178). Cabe referir que, nos trabalhos preparatórios, o problema surge equacionado a partir da resposta à questão da determinação de quando deve começar a correr o prazo da prescrição. Tendo em atenção que, na tradição romanística, o início da prescrição ligava-se à ideia da actio nata: actioni nondum natae non praes- cribitur ; mas discutia-se quando deve a ação considerar-se nascida – se no momento da violação do direito alheio (teoria da violação), se naquele em que o direito pode ser exercido (teoria da realização) –, depois de ponderar a doutrina e o direito comparado, concluiu Vaz Serra não ser de aceitar solução que faça correr o prazo de prescrição antes de o credor poder praticamente exercer o seu direito de impugnação, pois “uma vez que a prescrição se funda na inércia do titular do direito, deve ela, logicamente, começar no momento em que o direito pode ser exercido”, não sendo esse curso impedido pela ignorância do titular sobre a existência do direito e sobre a sua titularidade (cfr., Boletim do Ministério da Justiça, n.º 105, pp. 190 a 198). O que,

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