TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
406 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Já neste Tribunal, convidada pelo anterior Relator a enunciar, com clareza, as normas ou as concretas interpretações normativas que pretende ver apreciada, veio a recorrente prestar o seguinte esclarecimento: «(…) a norma cuja inconstitucionalidade se questiona é apenas a do número 1 do artigo 321.º do Código Civil, na interpretação propugnada pelo Acórdão recorrido, segundo a qual, como se disse no referido requeri- mento, a impossibilidade – por falta de meio processual adequado – de exercer, nos tribunais administrativos, o direito de indemnização contra uma entidade pública constitui motivo de força maior nos termos e para os efeitos do artigo 321.º, número 1, do Código Civil, e, por conseguinte, apenas implica suspensão do prazo de prescrição de tal direito nos últimos três meses desse prazo. Nesta medida e face a este esclarecimento, deverá o presente recurso prosseguir tendo por objeto a análise do número 1 do artigo 321.º do Código Civil, na interpretação seguida pelo Acórdão recorrido que se acabou de indicar, sendo as normas constitucionais violadas aquelas que foram referidas no requerimento de interposição do recurso.» 2.1. Determinado o prosseguimento dos autos, veio a recorrente apresentar alegações, com o seguinte remate conclusivo: «A. Para o Acórdão recorrido, a impossibilidade processual de um lesado ( in casu , a A.) exercer, nos tribunais admi- nistrativos, o direito a uma indemnização pelos danos sofridos constitui, para efeitos de contagem do respetivo prazo prescricional previsto número 1 do artigo 498.º do Código Civil, um “motivo de força maior”, o qual, por sua, vez, de acordo com o número 1 do artigo 321.º do mesmo Código, apenas implicaria a suspensão desse prazo nos últimos três meses do mesmo; B. Interpretado e aplicado da forma que foi, o número 1 do artigo 321.º do Código Civil é inconstitucional, por representar uma restrição inadmissível dos direitos fundamentais da A. a uma compensação pelos danos sofridos em virtude da atuação de uma entidade pública (artigo 22.º da Constituição) e à tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos (artigos 20.º, número 1 e 268.º, número 4, da Constituição); C. Em primeiro lugar, porque a norma em apreço, com a interpretação que lhe foi conferida, se traduziu num encurtamento irrazoável e excessivo do prazo de que a A. dispôs para exercer o seu direito fundamental a uma indemnização; D. O artigo 321.º, número 1 do Código Civil, se interpretado, como foi pelo Acórdão recorrido, no sentido de abranger a situação sub iudice – isto é, uma situação, como foi qualificada pelo Tribunal a quo, em que o lesado esteve impossibilitado de exercer jurisdicionalmente o seu direito indemnizatório –, viola o artigo 22.º da Constituição, na medida em que impõe ao lesado pela atuação de uma entidade pública (no caso dos autos, a A.) a necessidade de exercer o seu direito fundamental e sob pena de prescrição do mesmo, num prazo máximo de três meses, o que é manifestamente insuficiente, como resulta desde logo da comparação com o prazo geral de prescrição de três anos decorrente do artigo 498.º, número 1, do Código Civil; E. Apesar de o Acórdão recorrido considerar que a Recorrente dispôs do prazo geral de três anos e que este se suspendeu apenas nos últimos três meses, nos termos do artigo 321.º, número 1, do Código Civil, a verdade é que a consideração de um lesado (como a A., neste caso) que não tenha disposto, antes do deferimento expresso da sua pretensão, ocorrido mais de três anos após o início da contagem daquele prazo, de qualquer meio pro- cessual para efetivar o seu direito, evidencia que o início do prazo prescricional a partir do indeferimento tácito é meramente ilusório – uma simples aparência – porque aquele lesado nunca pôde exercer o direito em questão durante esse período, o que torna expressiva a inconstitucionalidade daquela norma, na interpretação seguida pelo Tribunal a quo ; F. De considerar ainda que não existe qualquer motivo constitucionalmente adequado que determine a necessi- dade ou que permita sustentar a proporcionalidade daquela restrição ao direito fundamental a uma compensa- ção pelos prejuízos provocados por uma entidade pública;
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