TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
371 acórdão n.º 82/14 um conflito, apreciando a decisão reclamada que é contrária à pretensão do reclamante e, nessa medida, atua no exercício de funções jurisdicionais» (cfr. a Decisão Sumária n.º 133/07, transcrita, no que ora releva, no Acórdão n.º 525/07); – O modo de designação dos presidentes dos tribunais superiores, bem como o exercício do respetivo cargo por tempo determinado, não colide com a respetiva qualidade de juízes em efetividade de funções, aos quais a lei pode atribuir as funções jurisdicionais que entenda justificarem-se; – Ainda que a regra nos tribunais superiores seja a da decisão por via de deliberação colegial, tal não corresponde a qualquer imposição constitucional e nada impede que o legislador ordinário possa optar, em nome de valores como a celeridade processual, pela decisão singular. Por conseguinte, o Tribunal Constitucional já afirmou – e vem reiterá-lo agora, mais uma vez – que os despachos proferidos pelos presidentes de tribunais superiores no âmbito de «reclamações» de despachos de não admissão de recursos interpostos para esses mesmos tribunais configuram atos próprios da função jurisdicional. Assim, o facto de esses despachos serem, por um lado, singulares e, por outro, proferidos por magistrados em virtude das funções específicas que exercem nos tribunais superiores e não de um qualquer ato de alocação aleatória, não constitui uma menorização da qualidade dos mesmos, os quais configuram verdadeiras decisões judiciais (cfr., em especial, os citados Acórdãos n. os 351/07 e 525/07. Recorde-se que nos presentes autos nos movemos no âmbito do artigo 20.º da Constituição (acesso ao direito), com referência ao processo civil. Deste modo, tendo o legislador efetivado, quanto às decisões pro- feridas a propósito da admissibilidade do recurso da decisão de primeira instância, um duplo grau de jurisdi- ção – o qual se traduz na reapreciação das decisão de não admissão por um magistrado, pertencente a outro tribunal, em sede do exercício próprio da função jurisdicional –, cumpre verificar a inexistência de qualquer violação da liberdade de conformação de que o legislador goza neste domínio. Conclui-se, portanto, pela não violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva. D. Da violação do princípio do juiz natural 14. A recorrente invoca ainda a violação do princípio do juiz natural (cfr. supra no n.º 2, a conclusão 15.ª das alegações de recurso). O mencionado Acórdão n.º 525/07, a propósito precisamente do artigo 689.º, n.º 2, do Código de Pro- cesso Civil, na redação que subjaz ao objeto do presente recurso considerou já que o mecanismo processual da reclamação para o presidente do tribunal superior não colidia com a garantia constitucional do «juiz legal». Porém, a recorrente pretende derivar deste parâmetro fundamental a exigência de aleatoriedade e inde- terminabilidade do juiz competente para determinada decisão antes de efetuado o ato de distribuição. Tal exigência, contudo, não integra o conteúdo do princípio constitucional do juiz natural. 15. Este princípio encontra-se expressamente consagrado no âmbito das garantias em processo criminal, dispondo o artigo 32.º, n.º 9, da Constituição, que “[n]enhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior”. Segundo Jorge de Figueiredo Dias, “o princípio do juiz legal ou natural esgota o seu conteúdo de sentido material na proibição da criação ad hoc , ou da determinação arbitrá- ria ou discricionária ex post facto, de um juízo competente para a apreciação de uma certa causa penal” (vide Autor cit., “Sobre o sentido do princípio jurídico-constitucional do ‘juiz natural’”, in Revista de Legislação e de Jurisprudência , 111.º ano – 1978/1979, pp. 83-88, p. 83). Mesmo entendendo o princípio do juiz natural como dimensão resultante do princípio geral da inde- pendência que vale para toda e qualquer instância judicial, independentemente da matéria em causa – nos termos do artigo 203.º da Constituição – o seu alcance não tem uma abrangência mais vasta do que a exigência do respeito pelo «juiz legal» que o legislador constituinte optou por consagrar especificamente no campo das garantias de defesa em matéria penal. Percebe-se que o tenha feito aí, uma vez que a teleologia do
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=