TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
370 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 12. Entende ainda a recorrente que da solução normativa sub judicio decorre a violação do seu direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva uma vez que “a possibilidade de rejeição de um recurso interposto perante um tribunal superior só se coadunará com aquele [direito] se for garantido ao recorrente que é esse mesmo tribunal, em coletivo – tal como a lei o institui –, o órgão com a última palavra sobre a admissibilidade do recurso”. E acrescenta: “[s]e assim não for (…) não estará devidamente garantida à parte processual a possibilidade de recorrer da decisão em causa (…) uma vez que, tal como sucede com a exceção consagrada no n.º 3 do artigo 700.º do CPC, o mesmo apenas se poderá socorrer de uma mera reclamação deduzida perante um órgão singular” (cfr. fls. 212), aduzindo ainda que “não pode[m] as garantias de recor- ribilidade do despacho de indeferimento do referido requerimento ser menores apenas pelo facto de esse despacho emanar do juiz de primeira instância” (cfr. fls. 220 e 221). Desta argumentação resultam dois enunciados distintos: (i) o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva postula que, em caso de recorribilidade de determinada decisão, deve ser sempre garantido o acesso ao tribunal ad quem – no seu figurino legalmente prescrito – para discutir, em última instância, a questão da admissibilidade do recurso; (ii) a apreciação da questão da admissibilidade do recurso por um órgão singular oferece menos garantias. De acordo com o primeiro enunciado, o acesso ao tribunal ad quem , em situações como as dos autos, imporia o direito de recorrer para a conferência uma vez que a relação é, “tal como a lei o institui, um tribunal coletivo”. A este propósito, Alberto dos Reis referia que “a Relação é, por índole, um tribunal coletivo, [pelo que qualquer decisão demanda a intervenção de três juízes e o mínimo de dois votos conformes (…). [A]o passo que o juízo de direito é um tribunal singular, a Relação é um tribunal coletivo” ( Código de Processo Civil Anotado, volume V, Coimbra, Coimbra Editora, 1981, pp. 421 e 422). 13. Sucede que em sede de fiscalização judicial da constitucionalidade não há lugar para querelas acadé- micas relativas à dogmática infraconstitucional. A qualificação do tribunal da relação como tribunal coletivo, impondo, enquanto tal, que qualquer decisão oriunda dessa instância, para que possa ser final, tenha de ser obrigatoriamente proferida por um colégio é, por conseguinte, nesta sede, irrelevante. O que interessa apurar é se as exigências constitucionais se encontram observadas – e tais exigências passam, no caso concreto, por ave- riguar se se encontra devidamente satisfeito o direito da recorrente a aceder ao direito e à tutela judicial efetiva. É certo que, como já se referiu, não existe um direito fundamental geral a recorrer de toda e qualquer decisão judicial. Sucede, no entanto, que a opção legal vai no sentido de garantir o direito a impugnar a deci- são que veda a admissão do recurso da decisão proferida em primeira instância. Não cabe agora escrutinar uma tal opção legal. Ainda assim, é de salientar que, tratando-se do recurso de decisão proferida em primeira instância, e cabendo a decisão inicial quanto à admissibilidade do recurso ao magistrado que é precisamente o autor da referida decisão de mérito, seria difícil vislumbrar uma solução constitucionalmente conforme que não permitisse o controlo judicial de tal decisão por parte de outro magistrado ou tribunal. Se assim não ocorresse, toda tramitação da lide poderia correr, em casos de não admissão do recurso, por conta de um único magistrado ou de um único tribunal, o que poderia suscitar dúvidas sob o ponto de vista da garantia da tutela judicial efetiva. O Tribunal Constitucional já apreciou, em jurisprudência anterior, soluções legislativas que cometem ao presidente do tribunal superior – enquanto tribunal ad quem – a tarefa de apreciar a impugnação de deci- sões de não admissão de recurso proferidas pelo tribunal a quo. Fê-lo a propósito da solução consagrada no regime processual civil anterior à reforma dos recursos operada em 2007 – e que integra o objeto dos presen- tes autos – bem como relativamente a solução semelhante que resulta dos artigos 405.º, n. os 1 e 4, do Código de Processo Penal (cfr. Acórdãos n. os 321/07 e 525/07). Desse acervo jurisprudencial resulta o seguinte: – Os juízes presidentes dos tribunais superiores são magistrados recrutados e nomeados de acordo com o disposto no artigo 215.º da Constituição, aos quais a lei atribui competências administrati- vas e jurisdicionais; – Quando o presidente do tribunal superior se pronuncia sobre a reclamação de um despacho que não admitiu ou reteve um recurso proveniente de um tribunal de hierarquia inferior está a «dirimir
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