TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
354 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Conforme resulta da consulta dos trabalhos parlamentares da Revisão Constitucional de 1997, a refe- rência às contribuições financeiras constante da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, procurou abranger precisamente o mencionado tertium genus. Assim, para efeitos de submissão dos diversos tipos de tributo ao princípio da reserva de lei formal, a nova redação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, passou a fazer referência a três espécies tributárias, autonomizando a categoria das “contribuições financeiras” a par das taxas e dos impostos, conti- nuando estes sujeitos à reserva da lei formal, enquanto, relativamente às taxas e às contribuições financeiras, apenas a definição do seu regime geral terá que respeitar a reserva de lei parlamentar. Com esta alteração deixou de fazer qualquer sentido equiparar a figura das contribuições financeiras aos impostos para efeitos de considerá-las sujeitas à reserva da lei formal. Tecidas estas considerações gerais, importa agora apreciar qual a natureza da “penalização” sobre as emissões excedentárias, no sentido de saber a qual destas categorias a mesma deverá ser reconduzida, sendo que, para tanto, apenas relevará o regime jurídico concreto da referida “penalização”, sendo indiferente o nomen juris atribuído na lei. No caso, sendo de reconhecer algumas dificuldades na qualificação deste tributo, não se podendo falar da existência de uma verdadeira relação comutativa, a não ser de forma difusa, afigura-se-nos que o mesmo não é reconduzível, atento o seu regime, quer à categoria unilateral do imposto, quer à categoria bilateral da taxa, aproximando-se antes de outras figuras acima referidas, designadas genericamente no texto consti- tucional por “demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas” (sobre a natureza jurídica das receitas arrecadadas pelo Estado pela atribuição de licenças de emissão, cfr. Carlos Costa Pina, em “Mercado de Direitos de Emissão de CO 2 ”, in Estudos Jurídicos e Económicos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco , Vol. I, pp. 493-502) . Segundo Sérgio Vasques estes tributos situam-se no terreno intermédio que vai das taxas aos impos- tos, incluindo-se nesta categoria «não apenas as taxas de regulação económica, mas toda a parafiscalidade associativa, as contribuições para a segurança social, as contribuições especiais de melhoria, assim como o universo crescente dos tributos ambientais, todos eles com estrutura paracomutativa, dirigidos à compensa- ção de prestações de que os sujeitos passivos são presumíveis causadores ou beneficiários» (em “As Taxas de Regulação Económica em Portugal: Uma Introdução”, in As Taxas de Regulação Económica em Portugal , p. 38, da edição da Almedina, 2008). E de acordo com Suzana Tavares da Silva estes tributos podem «agrupar-se em três tipos fundamentais: 1) como instrumento de financiamento de novos serviços de interesse geral que ocasionam um benefício con- creto imputável a alguns destinatários diferenciados (exemplo, prevenção de riscos naturais) – contribuições especiais financeiras; 2) como instrumento de financiamento de novas entidades administrativas cuja atividade beneficia um grupo homogéneo de destinatários (exemplo, taxas de financiamento das entidades reguladoras) – contribuições especiais parafiscais; e 3) como instrumentos de orientação de comportamentos (finalidades extrafiscais) – contribuições orientadoras de comportamentos ou (…) contribuições especiais extrafiscais» (Em “As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário”, in Estudos Regionais e Locais , 2008, pp. 48 e segs.). Atento o caráter híbrido da “penalização” prevista no artigo 25.º, n. os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, e uma vez que a mesma tem em vista, em primeira linha, uma finalidade extrafiscal de “orientação de comportamentos”, em termos jurídico-constitucionais, tal aponta para que a mesma deva ser enquadrada na categoria das contribuições financeiras constante da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, importando, pois, apreciar se o Governo poderia intervir legislativamente nesta matéria. Conforme já acima se mencionou, após a revisão constitucional de 1997, o texto constitucional passou a referir-se a três categorias de tributos, continuando os impostos sujeitos à reserva da lei formal, enquanto, relativamente às taxas e às contribuições financeiras, apenas a definição do seu regime geral tem que respeitar essa reserva de competência, podendo a concreta criação deste tipo de tributos, ao contrário dos impostos, ser efetuada por diploma legislativo governamental, sem necessidade de autorização parlamentar.
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