TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

353 acórdão n.º 80/14 dotada de poderes públicos) ou da vantagem decorrente da utilização individual de um bem público ou do prejuízo causado a um bem coletivo (vide J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, em Constituição da Repú- blica Portuguesa Anotada , Volume I, p. 1093, da 4.ª edição, da Coimbra Editora). A sinalagmaticidade que caracteriza as quantias pagas a título de taxa só existirá quando se verifique uma contrapartida resultante da relação concreta com um bem semipúblico, que, por seu turno, se pode definir como um bem público que satisfaz, além de necessidades coletivas, necessidades individuais (vide Teixeira Ribeiro, em “Noção jurídica de taxa”, na Revista de Legislação e de Jurisprudência , ano 117.º, p. 291). A taxa “pressupõe, ou dá origem, a uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta (que pode ser ou não de benefício) entre o contribuinte e um bem ou serviço público”, sendo “grande a variabilidade do conteúdo jurídico do con- ceito, resultante da diversidade das situações que geram as obrigações de taxa e das múltiplas delimitações formais da respetiva noção financeira” (Sousa Franco, em Finanças Públicas e Direito Financeiro , volume II, pp. 63-64, da 4.ª edição, da Almedina). Atualmente, podemos encontrar no artigo 4.º, n.º 2, da LGT, acima transcrito, a previsão dos factos que poderão dar lugar à cobrança de taxas, as quais assentam “na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstá- culo ao comportamento dos particulares”. No entanto, o sistema fiscal português conhece uma grande variedade de outras figuras tributárias que não se acomodam facilmente às categorias de taxa ou de imposto. Daí que, fugindo a esta divisão dicotómica, alguma doutrina tenha começado a apontar a existência de uma categoria intermédia de tributos, na qual se enquadram outras figuras marginais designadas como tributos parafiscais [cfr. artigo 3.º, n.º 1, alínea a) , da Lei Geral Tributária]. Não obstante a existência destas figuras tributárias no sistema fiscal português, o próprio texto constitu- cional anterior à revisão operada em 1997, ao estabelecer a reserva de lei parlamentar em matéria fiscal, con- sagrava no artigo 168.º (atual artigo 165.º) uma marcada distinção entre os impostos e as demais categorias tributárias, convidando a uma representação dicotómica dos tributos. Assim, para efeitos de reserva de lei parlamentar, a doutrina e a jurisprudência distinguiam entre impos- tos (abrangidos pela reserva de lei parlamentar) e taxas (não sujeitas a tal reserva) e procuravam equiparar os apelidados tributos parafiscais à categoria dos impostos ou à das taxas, para concluírem se a sua criação estava ou não sujeita ao princípio da reserva de lei formal (vide Nuno de Sá Gomes, em Manual de Direito Fiscal , vol. I, pp. 315 e segs., da 12.ª edição, do Rei dos Livros, Sousa Franco, na ob. cit. , pp. 74-76, e Casalta Nabais, em O dever fundamental de pagar impostos , pp. 256-257, da edição de 1998, da Almedina). A jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, por seu turno, foi firmando, aliás, o entendimento no sentido de alargar a noção constitucional de imposto e da reserva de lei parlamentar a todos os tributos que não possam rigorosamente dizer-se taxas, por forma a prevenir que o legislador subvertesse a distribuição constitucional de competências, lançando mão de tributos que, não sendo verdadeiramente unilaterais, não chegam no entanto a ser taxas. Podemos encontrar exemplos desse entendimento em diver- sos acórdãos sobre as antigas taxas de regulação económica, em que o Tribunal Constitucional admite a sua equiparação aos impostos, pelo menos, para efeitos da reserva de lei parlamentar. É o caso, entre outros, dos Acórdãos n. os 261/86 (taxas sobre produtos oleaginosos), 387/91 (taxas sobre as vendas de pastas químicas), 369/99, 370/99 e 96/00 (taxas da peste suína). Contudo, com a revisão constitucional de 1997, a alteração introduzida na redação da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição [anterior alínea i) do n.º 1 do artigo 168.º], veio obrigar a uma reformulação dos pressupostos da discussão sobre esta matéria. Onde anteriormente o artigo 168.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição dizia que “é da exclusiva compe- tência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: (…) i) Criação de impostos e sistema fiscal (…)” passou a constar que “é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: (…) i) Criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas (…)”.

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