TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
345 acórdão n.º 80/14 norma com fundamento na respetiva inconstitucionalidade, não o sendo aquelas em que o juízo efetuado pela decisão impugnada se consubstancia num simples obiter dictum em matéria de constitucionalidade ou quando a norma cuja aplicação foi recusada com fundamento na sua inconstitucionalidade acaba por não relevar, em termos decisivos, como ratio decidendi da pronúncia do tribunal quanto ao caso concreto. No caso dos autos, o tribunal recorrido recusou a aplicação das normas constantes dos artigos 25.º, 25.º-A e 26.º do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, com fundamento em inconstitucionalidade orgânica [embora, na decisão recorrida se refira que tais normas são declaradas “organicamente inconstitu- cionais”, tal afirmação deverá ser entendida como uma recusa de aplicação das normas em questão]. Nos autos está em causa a decisão do Diretor Geral da Agência Portuguesa do Ambiente que determinou a aplicação de uma penalização nos termos previstos no artigo 25.º, n. os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, sendo que a ação administrativa proposta pela recorrida teve em vista impugnar a apli- cação desta penalização, sem que se tenha colocado qualquer questão quanto à matéria regulada nos n. os 3 e 4 deste artigo 25.º, ou relativa à entidade competente para assegurar o cumprimento do previsto no refe- rido artigo 25.º (matéria regulada no artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro), não estando também em causa a aplicação de qualquer das contraordenações previstas na norma do artigo 26.º do mencionado Decreto-Lei e enumeradas no n.º 1 deste último artigo. Assim, embora a decisão recorrida tenha, genericamente, recusado a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade orgânica, dos artigos 25.º, 25.º-A e 26.º do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, na verdade apenas as normas contidas nos n. os 1 e 2 do artigo 25.º deste Decreto-Lei, foram tidas como aplicáveis ao caso concreto, integrando a ratio decidendi do aresto proferido pelo tribunal recorrido. Ora, face ao caráter ou função instrumental dos recursos de fiscalização concreta, exige-se, para que o recurso tenha efeito útil, que a norma cuja aplicação tenha sido recusada com fundamento em inconstitucio- nalidade constitua ratio decidendi do acórdão recorrido, pois só assim um eventual juízo de não inconstitu- cionalidade poderá determinar uma reformulação dessa decisão. Face ao exposto, importa concluir que, relativamente às normas dos n. os 3 e 4 do artigo 25.º e dos arti- gos 25.º-A e 26.º do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, não está preenchido este requisito de admissibilidade do recurso de constitucionalidade previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da LTC, pelo que, nesta parte, o Tribunal não deverá tomar conhecimento do recurso. 2. Do mérito do recurso A decisão recorrida recusou a aplicação dos n. os 1 e 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro, com fundamento na sua inconstitucionalidade orgânica. De acordo com a referida deci- são, tendo este diploma procedido à transposição da Diretiva n.º 2003/87/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia, de 13 de outubro, para a ordem jurídica interna, e porque nalgumas das suas normas (onde se inclui o disposto nos n. os 1 e 2 do artigo 25.º) se estabelece um regime sancionatório – aplicação de coimas –, cuja competência legislativa constitui reserva da Assembleia da República, não tendo o Governo obtido a pertinente autorização legislativa, tais normas são organicamente inconstitucionais, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea d), da Constituição. Ou seja, e em síntese, a decisão recorrida entendeu que as normas desaplicadas integravam matéria incluída no âmbito da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, por respeita- rem ao regime geral de punição dos atos ilícitos de mera ordenação social e do respetivo processo, nos temos previstos na referida alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, pelo que, não dispondo o Governo de autorização legislativa por parte da Assembleia da República para legislar sobre a matéria, concluiu que as normas em causa são organicamente inconstitucionais. Antes de mais, importa atentar no teor das normas objeto dos presentes autos, ou seja, das normas dos n. os 1 e 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 233/2004, de 14 de dezembro (na redação em vigor após as
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