TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
335 acórdão n.º 69/14 dor não é inibido da administração e disposição dos seus bens, não é aberto o incidente de qualificação da insolvência, nem a sentença é objeto de qualquer publicidade. Estes efeitos não constituem, porém, direitos do devedor, antes configuram consequências da apresentação pelo mesmo de um plano de pagamentos que reuniu a aprovação dos credores, seguramente, por satisfazer os interesses destes. De todo o modo, as consequências para o devedor da não aprovação do plano que apresentou não inte- gram o conteúdo da decisão de não suprimento da vontade de qualquer credor. Elas surgem apenas como resultado dos atos processuais subsequentes no encadeado lógico que compõe o processo de insolvência e, como tal, não podem deixar de ser avaliadas na ponderação dos equilíbrios que ali se jogam. Numa tal pon- deração impõe-se com particular relevo a natureza urgente do processo falimentar. 14. A promoção da celeridade do processo de insolvência encontra, de há muito, reconhecimento pelo legislador infraconstitucional, enquanto fator decisivo de implementação de eficácia num procedimento que tem como principal objetivo a satisfação, pela forma mais eficiente, dos direitos dos credores. Como salien- tado por Menezes Cordeiro (“Introdução ao Direito da Insolvência”, in O Direito, 137.º, 2005, III, p. 480), «Podem ocorrer questões prévias, prejudiciais ou preliminares que, sendo consideradas – como não deixarão de ser, desde que pertinentes – alongam desmesuradamente todo o processo. Ao apontar, entre os processos especiais, a falência, o Direito Processual procurou apurar uma metodologia que acelere e simplifique as operações da liquidação de patrimónios, nela subjacentes». Operando como uma ação executiva universal e coletiva em que se jogam interesses contrapostos não apenas entre o insolvente e os credores, como também dos diversos credores entre si, o processo de insolvên- cia exige, com efeito, uma tramitação célere e simplificada. A apresentação de plano de pagamentos constitui uma faculdade atribuída ao devedor tendente a obviar à normal tramitação do processo de insolvência, abrindo um incidente que conduz à suspensão deste. O respetivo encerramento reabre, portanto, o processo de insolvência o qual, acautelando devidamente os direitos dos credores, dispensa o recurso a medidas cautelares (artigo 31.º do CIRE), cujo decretamento e execução sempre se configuraria como necessariamente mais moroso do que o prosseguimento dos trâmites normais do processo. Acresce que, partindo do devedor a iniciativa de pedir a sua declaração de insolvência, dificilmente se configura a verificação dos requisitos gerais de decretamento de uma medida cautelar, nomea- damente o receio ou risco efetivo da prática de atos lesivos dos direitos dos credores. No âmbito deste incidente, o legislador confiou à apreciação por um juiz, munido das garantias de inde- pendência constitucionalmente reconhecidas (artigo 203.º da Constituição), o suprimento da aprovação dos credores. Esta decisão é, pois, proferida no âmbito de um incidente do processo de insolvência que, visando obviar à tramitação normal do processo de insolvência, implica a suspensão deste. Simplesmente, para que aquela suspensão se verifique é necessário que o devedor apresente um plano de pagamentos suscetível de colher a aprovação dos seus credores. Em coerência com este desiderato, recorde-se que o juiz só suspende o processo de insolvência se não se lhe afigurar “altamente improvável que o plano de pagamentos venha a merecer aprovação” (artigo 255.º, n.º 1, do CIRE). Caso contrário, dá o incidente por encerrado sem que desta decisão caiba recurso ( idem ). Nesta articulação dos vários interesses que se jogam na apreciação do pedido de suprimento da vontade de alguns credores, a operar num tempo necessariamente côngruo e no respeito pela adequada racionalização do sistema judiciário, o acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva através da apreciação num grau de jurisdição satisfaz as exigências contidas no artigo 20.º da Constituição. 15. Das considerações anteriores resulta claro que não se está perante nenhum dos casos em que a juris- prudência constitucional reconhece a exigência de um duplo grau de jurisdição – não se está no âmbito do processo penal nem se impõem restrições a direitos, liberdades e garantias. De facto, os efeitos decorrentes para o devedor, sendo-lhe favoráveis, não constituem, seus direitos mas antes consequências da faculdade de apresentação pelo mesmo de um plano de pagamentos e da reunião, por este, da aprovação dos credores.
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