TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

334 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Apesar de o plano de pagamentos não ter um conteúdo típico definido na lei, ele não pode deixar de prosseguir o único fim para que é instituído. E este, como já acima assinalado, é a satisfação dos interesses dos credores. Nos termos do artigo 252.º, n.º 1, do CIRE «o plano de pagamentos deve conter uma proposta de satisfação dos direitos dos credores que acautele devidamente os interesses destes, de forma a obter a respetiva aprovação, tendo em conta a situação do devedor » (sublinhado nosso). Assim, ainda que por recurso a um cri- tério pragmático, o CIRE não deixa de indicar o grau de satisfação dos credores que o plano de pagamentos tem necessariamente de assegurar. Como salientado por Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, cit., p. 812: «Em termos concretos, pode dizer-se que o legislador indica aqui ao devedor dois critérios a que deve atender na formulação da proposta do plano de pagamentos a apresentar aos seus credores: um absoluto e outro relativo. Segundo o primeiro, as medidas do plano devem ser tais que assegurem aos credores a satisfação dos seus inte- resses em medida que os leve a aceitá-lo, por ser, pelo menos, correspondente à satisfação que o prosseguimento do processo de insolvência, nas suas várias fases, razoavelmente acarretaria. O grau de satisfação dos interesses dos credores não pode deixar de ter em conta a situação patrimonial do devedor. Está aqui presente uma ideia de proporcionalidade, no sentido de aquilo que o plano oferece aos credores deve ser aferido em função do que eles poderiam esperar receber, atendendo a essa situação». Conclui-se, assim, que o plano de pagamentos tem necessariamente de ter um conteúdo que permita a aprovação dos credores. É este o seu objetivo. Pelo que constitui interesse do devedor apresentar um plano que permita aos credores, tendo em conta a situação económica daquele, preferir a sua aprovação a correr os riscos inerentes à prossecução dos trâmites normais do processo de insolvência. O suprimento da aprovação dos credores surge, pois, apenas num segundo momento, depois de apre- sentado o plano, e pressupõe a aprovação de credores que representem mais de dois terços do valor total dos créditos relacionados pelo devedor. Apesar de poder ser requerido pelo devedor (como por qualquer dos credores que aprovam o plano) o deferimento do suprimento da vontade dos credores, tal como a aprovação do plano de pagamentos, não configuram direitos subjetivos (de tipo potestativo) deste. Apenas se estiverem reunidos os pressupostos previstos nas alíneas do n.º 1 do artigo 258.º do CIRE, o tribunal poderá suprir a aprovação dos demais credores, o que exige do juiz uma complexa avaliação dos dados disponíveis, necessa- riamente caraterizados ainda por uma forte incerteza em função da fase em que o processo se encontra (desde logo, perante a suspensão do processo de insolvência, os elementos disponíveis quanto à situação do devedor são apenas os fornecidos por este nos anexos ao plano apresentado). Se o plano de pagamentos não for aprovado, os autos retomam os trâmites normais do processo de insolvência, sendo reconhecido ao devedor o direito de recorrer da decisão que declarar a sua insolvência, nos termos gerais. 13. Não se olvida que o indeferimento do pedido de suprimento da vontade de credores oponentes do plano conduz à não homologação do plano de pagamentos e esta acarreta consequências para o devedor. Com efeito, a não aprovação do plano de pagamentos implica a retoma dos termos do processo de insol- vência, cessando a suspensão determinada pela decisão prevista no artigo 255.º, n.º 1, do CIRE. O processo segue, então, com a prolação da sentença de declaração de insolvência (artigo 262.º do CIRE), a menos que, ao apresentar o plano de pagamentos o devedor tenha desde logo declarado que, no caso de não aprovação do plano, pretende a exoneração do passivo restante. Nesta situação é aberto o incidente regulado nos artigos 235.º e seguintes, do CIRE (vide artigo 254.º). Ora, é inegável a mitigação dos efeitos da declaração da insolvência na sequência de aprovação do plano de pagamentos, quando comparada com a insolvência declarada sem a aprovação de um tal plano. Tenha-se em consideração, em especial, que no caso de aprovação do plano de pagamentos por si apresentado, o deve-

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