TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

330 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL em nome daqueles princípios, não se posterguem, de forma irrazoável e desproporcionada estes direitos». Ora, ainda no entendimento do tribunal recorrido, «da admissibilidade do recurso em causa não decorre prejuízo considerável para os credores, pois, como se sabe, não obstante o recebimento do incidente do plano de pagamentos aos credores implicar a suspensão do processo de insolvência até à decisão do incidente (cfr. n.º 1 do artigo 255.º do CIRE), sempre podem ser adotadas as medidas cautelares previstas no artigo 31.º do mesmo código, se tal se revelar necessário». E conclui-se na decisão recorrida: «Deste modo, tendo em conta os interesses em causa e as consequências para a esfera pessoal e patrimonial dos devedores decorrentes da não homologação do plano de pagamentos, com a consequente declaração da insolvência, nos termos gerais, e porque não se encontra fundamento material bastante que justifique a descriminação no tratamento das partes no que respeita à impugnação da decisão que se pronuncie sobre o suprimento da aprovação do plano de pagamentos pelos credores, nos termos acima enunciados, considera-se inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 2.º, 13.º e 20.º da Constituição, a norma do n.º 4 do artigo 258.º do CIRE, ao não permitir o recurso pelos devedores da decisão que indefira o pedido de suprimento da aprova- ção de qualquer credor, e, consequentemente, da sentença não homologatória do plano apresentado, recu- sando-se a sua aplicação ao abrigo do disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa». É esta, pois, a fundamentação da decisão recorrida. c) Do mérito do recurso
  8. A questão a decidir remete-nos para a temática do direito de recurso, em especial a vexata quaestio da exigência constitucional de um duplo grau de jurisdição, no caso relacionada especificamente com o regime jurídico do incidente da apresentação de plano de pagamentos aos credores no processo de insolvência. Importa, pois, começar por recordar o regime legal deste incidente do processo de insolvência. 9. O incidente do plano de pagamentos vem regulado nos artigos 251.º a 263.º do CIRE. Visa obviar à tramitação normal do processo de insolvência, pressupondo a elaboração de um plano que permita ao deve- dor liquidar as dívidas aos seus credores. É nesta possibilidade que reside a especialidade do regime específico da insolvência dos devedores não empresários ou titulares de pequenas empresas que ocupa o Capítulo II, do Título XI, do CIRE. Com a petição inicial do processo de insolvência (ou no prazo da contestação, caso não seja o reque- rente) o devedor que reúna os pressupostos previstos no artigo 249.º do CIRE pode apresentar um plano de pagamentos, aos credores, conjuntamente (artigo 251.º do CIRE). Se o incidente não for liminarmente encerrado (sem direito a recurso), por considerar altamente impro- vável que venha a merecer aprovação (artigo 255.º do CIRE), o juiz determina a suspensão do processo de insolvência até à decisão do incidente do plano de pagamentos (artigo 255.º do CIRE), seguindo-se a citação dos credores para se pronunciarem sobre o plano de pagamentos apresentado. No caso de nenhum dos credores recusar o plano de pagamentos, ou se a aprovação dos opositores ao plano for objeto de suprimento judicial (artigo 258.º do CIRE), o plano é aprovado (artigo 257.º, n.º 1, do CIRE) com a consequente homologação pelo juiz, seguindo-se, após trânsito, a declaração da insolvência do devedor no processo principal apenas com as menções referidas nas alíneas a) e b) do artigo 36.º  A eficácia de declaração da insolvência nestes moldes surge bastante atenuada relativamente à insolvência declarada nos termos gerais, desde logo por o devedor não ficar privado da administração e disposição dos seus bens. Acresce que não é aberto o incidente de qualificação da insolvência, nem a sentença é objeto de qualquer publicidade (cfr. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2.ª edição Quid Juris , p. 830). Se o incidente for logo encerrado (artigo 255.º, n.º 1, do CIRE) ou se o plano de pagamentos não lograr aprovação ou a respetiva sentença homologatória for revogada em sede de recurso, será proferida sentença de insolvência nos termos gerais (artigos 255.º, n.º 1, e 266.º do CIRE).

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