TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

329 acórdão n.º 69/14 II – Fundamentação a) Delimitação do objeto do recurso 5. O recurso foi interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – ou seja, trata-se do recurso de decisão de um tribunal que recusa a aplicação de uma norma com fundamento na sua inconsti- tucionalidade. A decisão do tribunal a quo incide sobre a norma contida no n.º 4 do artigo 258.º do CIRE. Este pre- ceito legal tem a seguinte redação: «Não cabe recurso da decisão que indefira o pedido de suprimento da aprovação de qualquer credor». 6. O referido preceito foi desaplicado pelo tribunal a quo, por inconstitucional, «ao não permitir o recurso pelos devedores da decisão que indefira o pedido de suprimento da aprovação de qualquer credor, e, consequentemente, da sentença não homologatória do plano apresentado». Sendo assim, a dimensão nor- mativa do referido preceito desaplicada pelo tribunal recorrido limita-se ao segmento que se traduz no não reconhecimento ao devedor da possibilidade de recorrer da decisão que indefira o pedido de suprimento da aprovação de qualquer credor. É esta dimensão normativa que o acórdão recorrido considera violadora dos artigos 2.º, 13.º e 20.º da Constituição sendo, por conseguinte, sobre ela que incide o objeto do presente recurso. b) Fundamentos da decisão recorrida 7. O tribunal a quo desaplicou o preceito em causa por violação dos artigos 2.º, 13.º e 20.º da Consti- tuição. Na base do assim decidido está a consideração de serem «inegáveis as vantagens para os devedores resul- tantes da aprovação do plano de pagamentos, ou, do suprimento dessa aprovação, tendo em conta que a insolvência que venha a ser decretada, na sequência da aprovação do plano, é uma insolvência “restrita” (…) pois não tem as “normais” consequências da declaração da insolvência, desde logo, porque o devedor, apesar de ser declarado insolvente, não fica privado dos poderes de administração e de disposição do seu patrimó- nio, e as sentenças de homologação do plano de pagamentos e de declaração de insolvência, bem como a decisão de encerramento do processo (que ocorre com o trânsito em julgado daquelas sentenças), nem sequer são objeto de qualquer publicidade ou registo (cfr. n. os 4 e 5 do artigo 259.º do CIRE)» (fls. 45). Entendendo que «a decisão de suprimento dos credores oponentes no plano de pagamentos, prevista no artigo 258.º do CIRE, reveste-se de particular importância para os devedores, pois dela depende a homologa- ção que venha a ser decretada, com as inerentes consequências na sua esfera pessoal e patrimonial» o tribunal a quo conclui que não se justifica, o impedimento ao recurso daquela decisão, previsto no n.º 4 do artigo 258.º do CIRE. Depois de assinalar que da mesma norma decorre, a contrario sensu , que a decisão de con- cessão do suprimento é recorrível nos termos gerais previstos no CIRE, ainda que «o ataque ao suprimento, em vista do que dispõe o artigo 259.º, n.º 3, do CIRE, tenha de ser feito, pelos credores cuja aprovação haja sido suprida, através da impugnação da sentença homologatória do plano de pagamentos», conclui-se na decisão recorrida que: «não se encontra fundamento bastante, nem no tipo de incidente em causa, nem na natureza e finalidade do processo de insolvência, que justifique tal diferenciação de tratamento entre as partes, colocando de um lado, os devedores, que, por via da norma do n.º 4 do artigo 258.º do CIRE ficam impedidos de recorrer da decisão que indeferira o pedido de suprimento da aprovação de qualquer credor, e, consequentemente, da sentença de não homologação do plano, e, do outro, os credores cuja aprovação haja sido suprida, que podem recorrer da sentença homologatória» (p. 46). Não deixando de salientar a relevância da tramitação urgente no processo de insolvência, para garantir a sua eficácia, sublinha-se todavia na decisão recorrida a necessidade de conciliar esse interesse com os «direitos fundamentais das partes, de modo a que,

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