TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
312 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL favorecem o devedor. Perante novas regras que dificultem o funcionamento da prescrição, é o credor que resulta favorecido. Daí, a justificação para limitar a autonomia privada na definição destas regras. Dentro do regime legal da prescrição, a norma em apreciação insere-se no domínio específico das regras referentes à sua interrupção que visam, mais uma vez, acautelar valores como a certeza e a segurança na valo- ração dos efeitos do tempo nas relações jurídicas. No equilíbrio do sistema, fundando-se a prescrição no não exercício do direito pelo seu titular, a mani- festação da intenção de o exercer, designadamente através do recurso aos tribunais, não pode deixar de inter- romper aquele efeito, anulando o prazo entretanto decorrido (artigo 326.º do CC). Evidenciada a intenção de exercer o direito através da interposição de ação judicial em que o mesmo é reclamado, deixa de estar nas mãos do titular do direito o controlo referente à sua efetivação. Por isso a lei prevê que, resultando a interrupção da prescrição da citação, o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 327.º, n.º 1, do CC). Pode, porém, acontecer que a citação não se faça logo, o que pode ser causado «por sobrecarga dos tri- bunais ou por razões atinentes ao próprio devedor» (António Menezes Cordeiro, ob. cit. , p. 197). De acordo com este Autor, «nessa altura, depois de requeridas as citações ou notificações, o processo escaparia das mãos do credor. No limite este poderia ter de assistir ao expirar do prazo, mercê de demoras às quais seria estra- nho. O legislador resolveu o problema no artigo 323.º, n.º 2: se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias». Resulta, assim, patente, que a norma em apreciação não põe em causa o princípio da segurança jurídica. 6.10. Tão-pouco se verifica – ou sequer é invocada – qualquer alteração de sentido jurisprudencial na aplicação pelos tribunais do artigo 323.º, n.º 2, do Código Civil, em conjugação com as demais normas que regulam a interrupção da prescrição naquele diploma legal, designadamente o artigo 327.º, n.º 1, norma que expressamente prevê que se a interrupção resultar de citação o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo. De todo o modo, tendo presente que cada juiz decide autonomamente os feitos que são submetidos ao seu julgamento, nem sequer é de reconhecer um direito à manutenção da jurisprudência dos tribunais. E sendo assim, manifesto é que a norma sob apreciação não viola o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança. III – Decisão Em face do exposto, decide-se: a) não julgar inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, na interpretação segundo a qual, numa ação executiva, se a citação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao exequente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias, mesmo que a citação venha a ter lugar mais de vinte anos após a verificação dos factos. b) Consequentemente, negar provimento ao recurso. Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta. Lisboa, 21 de janeiro de 2014. – Maria de Fátima Mata-Mouros – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes (vencida quanto ao conhecimento, nos termos da declaração junta) – Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido quanto ao conhecimento, pelas razões constantes da declaração da Senhora Con- selheira Maria João Antunes).
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