TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
298 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «Este preceito regula o exercício dos direitos dos credores contra o devedor no período do processo de insol- vência. A solução nele consagrada é a que manifestamente se impõe, pelo que, apesar da novidade formal, não significa, no plano substancial, um regime diferente do que não podia deixar de ser sustentado na vigência da lei anterior. Na verdade, o artigo 90.º limita-se a determinar que, durante a pendência do processo de insolvência, os cre- dores só podem exercer os seus direitos “em conformidade com os preceitos deste Código”. Daqui resulta que têm de o exercer no processo de insolvência e segundo os meios processuais regulados no CIRE. É esta a solução que se harmoniza com a natureza e a função do processo de insolvência, como execução uni- versal, tal como a caracteriza o artigo 1.º do CIRE. Um corolário fundamental do que fica determinado é o de que, para poderem beneficiar do processo de insolvência e aí obterem, na medida do possível, a satisfação dos seus interesses, têm de neles exercer os direitos que lhe assistem, procedendo, nomeadamente, à reclamação dos créditos de que sejam titulares, ainda que eles se encontrem já reconhecidos em outro processo (...).» Nessa medida, não se pode assacar ao entendimento normativo extraído da alínea e) do artigo 287.º do CPC, aplicado na decisão recorrida, a remessa do julgamento do litígio laboral da recorrente para outro foro, pois, por razões que encontram assento na teleologia fundamental do processo de insolvência – de que toma parte essencial precisamente, como emanações do princípio de igualdade, o princípio par conditio creditorum , em conexão com o princípio do contraditório –, a palavra final (a competência material, no plano dos factos e do direito) sobre o litígio, na perspetiva do seu reconhecimento e pagamento pelos bens em liquidação, sempre caberá ao Tribunal onde corra esse processo. Assim acontece com a recorrente, sem diferença de tra- tamento relativamente a qualquer outro credor reclamante na mesma posição material. O que significa que a extinção da instância laboral, por decorrência do trânsito em julgado da decisão que declarou a insolvência da sua entidade patronal, não a coloca em posição desigual, por indução de pre- juízo, ou de afastamento de posição de vantagem materialmente fundada, relativamente a outros credores com pretensão de satisfação dos seus direitos sobre bens integrados na massa insolvente. Falece, pois, fundamento à apontada violação do princípio da igualdade pela normação questionada. 10. A mesma ordem de considerações encontra pertinência quando ponderado o recurso na vertente da imputada violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva. O artigo 20.º da Constituição garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), em termos efetivos, o que comporta o direito à decisão da causa em prazo razoável (n.º 4), impondo-se especificamente ao legislador que, para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, assegure procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos (n.º 5). A jurisprudência do Tribunal Constitucional encontra-se consolidada na consideração de que o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional implica a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange nomeadamente: (a) o direito de ação, no sentido do direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o conse- quente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (cfr. Acórdão n.º 440/94).
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