TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

253 acórdão n.º 42/14 da participação é o elemento nuclear em torno do qual gravita a nova tributação consubstanciada na inde- dutibilidade do juros”. 16. Introduzida pela Revisão Constitucional de 1997, a proibição constitucional da imposição de impostos retroativos consagrada no artigo 103.º, n.º 3, da Lei Fundamental, tem amiúde merecido a atenção deste Tribunal. Ao longo de elaboração que encontra raízes em reflexão anterior à referida Revisão Constitu- cional, porque decorrente do princípio da proteção da confiança, inscrito no princípio do Estado de direito, nos termos do artigo 2.º da Constituição (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, pp. 1092 e 1093), o Tribunal Constitucional vem afirmando o enten- dimento de que a regra da proibição da retroatividade fiscal apenas se dirige à retroatividade autêntica, ou própria, abrangendo apenas os casos em que o facto tributário que a Lei Nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da Lei Antiga, excluindo do seu âmbito de aplicação as situações de retrospetividade ou de retroatividade imprópria, ou seja, as situações em que o facto que a Lei Nova pretende regular não ocorreu totalmente ao abrigo da Lei Antiga, antes continuando a formar-se na vigência da Lei Nova, pelo menos, quanto estão em causa impostos diretos relativos ao rendimento (Acórdãos n. os 128/09, 85/10, 399/10, 18/11 e 310/12). Ora, e acompanhando inteiramente o raciocínio constante da decisão recorrida, não ocorre, assim, com a normação questionada pelo recorrente qualquer tipo de retroatividade. Desde logo, importa notar que as considerações sobre a aplicação de Lei Nova fundadas em critério assente na modificação do quadro legal de elementos essenciais da relação jurídico-civil, em especial das relações obrigacionais, não podem ser transpostas para a relação jurídico-fiscal, alicerçada no conceito de facto tributário. Diga-se, em todo o caso, que o regime consagrado no artigo 12.º do Código Civil ressalva da aplicação da Lei Nova os efeitos jurídicos já produzidos e que a obrigação de juros, ainda que acessória da obrigação principal, dela preserva autonomia, por força do disposto no artigo 561.º do Código Civil, o que depõe em sentido oposto ao defendido pela recorrente, assente na continuidade das estipulações nesse domínio. Por outro lado, o elemento relevante na espécie não corresponde à amortização de financiamento, mas sim à remuneração do capital mutuado para aquisição de participação sociais, sendo esse – o gasto incor- rido – e o seu balanceamento com a suscetibilidade de propiciar ganho, através da realização de mais-valias, e não o acréscimo patrimonial em si mesmo, o cerne da normação editada no artigo 38.º, n.º 5, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro, e do regime de (in)dedutibilidade que passou a constar do artigo 31.º, n.º 2, do EBF. Acresce que, como se sublinha na decisão recorrida, o facto tributário em IRC corresponde à perceção de rendimento, sendo o gasto ou custo atendido na sua função instrumental face ao rendimento- -acréscimo sujeito a tributação (não isento). É certo que norma contida no n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, no que se refere aos “encargos financeiros”, constitui norma de incidência, na medida em que contribui para o apuramento do rendimento tributável da recorrente, versando variação patrimonial negativa que deixa de concorrer para a fixação do lucro tributável (cfr. António Moura Portugal, A dedutibilidade dos custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, p. 104). E, como se diz no Acórdão n.º 620/99, “a fixação da matéria coletável constitui um momento central da determinação do montante do imposto, pois influen- cia decisivamente o apuramento do respetivo quantum (interferindo, consequentemente, nas garantias do contribuinte). Nessa medida, consubstancia um elemento estruturante da obrigação tributária, integrando, desse modo, o núcleo fundamental do conjunto de matérias cobertas pelas normas constitucionais de âmbito fiscal”. Daí decorre a sujeição de regra que influa na fixação da matéria coletável, como inegavelmente acon- tece com a normação alojada no n.º 2 do artigo 31.º do EBF, ao princípio da retroatividade da lei fiscal. Também não parece oferecer contestação de que os juros que remuneram capitais alheios, mormente por operações de crédito, integram o conceito de encargos financeiros, de acordo com a exemplificação constante do artigo 23.º, n.º 1, alínea c), do CIRC.

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