TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

247 acórdão n.º 42/14 ativos detidos pelas SGPS, pois esse posicionamento, precedido da afirmação da desnecessidade de discorrer sobre o problema, constitui claro obiter dictum . Assim, também no plano material, consubstanciado na formulação que se encontra enunciada na ter- ceira questão elencada, a questão de constitucionalidade reportada a dimensão normativa extraída interpre- tativamente do artigo 31.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, em termos de impedir a determinação dos encargos financeiros suportados com aquisição de partes de capital por recurso a métodos de afetação direta ou específica, ou real, não pode ser admitida, pois não se mostra efetivamente aplicada, como ratio decidendi , pela decisão arbitral recorrida. Termos em que cabe afastar o conhecimento das duas últimas questões, por inverificados os pressupostos objetivos do recurso, face ao disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 80.º, n.º 2, da LTC, prosseguindo a apreciação do mérito do recurso tão somente quanto às duas primeiras questões de constitucionalidade. C) Do mérito do recurso 12. As questões de constitucionalidade colocadas à apreciação deste Tribunal e de que cabe conhecer inscrevem-se em dissídio atinente ao regime de tributação das Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS) em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), no caso vertente com referên- cia ao ato de (auto)liquidação respeitante ao exercício do ano de 2003. Na espécie, as questões normativas formuladas decorrem, na ótica da recorrente, da regra de indedu- tibilidade de custos financeiros das SGPS (em comum com as Sociedades de Capital de Risco) acolhida no n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, fruto da redação conferida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro, versando o domínio material da dedução de encargos financeiros com a aquisição de participações financeiras, seja porque aplicável a relações jurídicas constituídas anteriormente à entrada em vigor da referida intervenção legislativa (aí em conjugação com o disposto no n.º 5 do artigo 38.º da referida Lei), seja na sua articulação com a tributação de mais-valias pela transmissão onerosa de participações sociais, quando estas não se realizem. Justifica-se, assim, começar pelo enquadramento dessa modificação legislativa, no contexto normativo mais amplo do regime fiscal das SGPS, reconhecidamente complexo, em particular quanto à tributação das mais-valias obtidas com a transmissão onerosa de participações sociais e a sua interligação com a dedução ao lucro tributável de encargos financeiros suportados com a aquisição de tais partes de capital (Júlio Tormenta, As Sociedades Gestoras de Participações Sociais como instrumento de planeamento fiscal e os seus limites, 2011, p. 139, refere-se-lhe como “autêntico ‘puzzle’”). 12.1. As SGPS têm como antecedentes as sociedades holding, as quais encontram a primeira regulação no Decreto-Lei n.º 46032, de 27 de abril de 1965. Seguiu-se-lhe o Decreto-Lei n.º 271/72, de 2 de agosto, estabelecendo o regime jurídico das sociedades que comportem como objeto a gestão de participações, dis- tinguindo entre “sociedades de controlo”, “sociedades de investimento” e “sociedades de aplicações de capi- tais”, e reconhecendo-lhes papel importante na organização e reforço do tecido empresarial nacional, através do estabelecimento e dinamização de um mercado financeiro que lhe sirva de apoio. Já assim se lhes referira o legislador, na edição de isenção da tributação de Imposto de Capitais sobre juros e dividendos, através do Decreto-Lei n.º 44561, de 10 de setembro de 1962, dizendo: “[t]rata-se de remover um obstáculo de peso à criação de empresas cuja atividade consiste na mera gestão de uma carteira de títulos, e que no estrangeiro, por toda a parte – e até, nos últimos anos, particularmente em países em vias de desenvolvimento – tão grande papel desempenham, sobretudo as sociedades de colocação de capitais, na mobilização do aforro de certas classes, e na sua criteriosa aplicação naquele ou naqueles setores que um eficiente serviço de estudos económico-financeiros demonstre serem os de menor risco e de melhores expectativas de rendabilidade. Desnecessário será encarecer o alcance desta inovação”.

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