TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

245 acórdão n.º 42/14 Por isso não são vinculativos nem para os particulares nem para os tribunais. E isto quer sejam regula- mentos organizatórios, que definem regras aplicáveis ao funcionamento interno da administração tributária, criando métodos de trabalho ou modos de atuação, quer sejam regulamentos interpretativos, que procedem à interpretação de preceitos legais (ou regulamentares). É certo que eles densificam, explicitam ou desenvolvem os preceitos legais, definindo previamente o con- teúdo dos atos a praticar pela administração tributária aquando da sua aplicação. Mas isso não os converte em padrão de validade dos atos que suportam. Na verdade, a aferição da legalidade dos atos da administração tributária deve ser efetuada através do confronto direto com a correspondente norma legal e não com o regu- lamento interno, que se interpôs entre a norma e o ato”. Esses atos, em que avultam as “circulares”, emanam do poder de auto-organização e do poder hierárquico da Administração. Contêm ordens genéricas de serviço e é por isso e só no respetivo âmbito subjetivo (da relação hierárquica) que têm observância assegurada. Incorporam diretrizes de ação futura, transmitidas por escrito a todos os subalternos da autoridade administrativa que as emitiu. São modos de decisão padronizada, assumidos para racionalizar e simplificar o funcionamento dos serviços. Embora indiretamente possam proteger a segurança jurídica dos contribuintes e assegurar igualdade de tratamento mediante aplicação uniforme da lei, não regulam a matéria sobre que versam em confronto com estes, nem constituem regra de decisão para os tribunais. A circunstância de a Administração Tributária ficar vinculada (n.º 1 do artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária) às orientações genéricas constante de circulares que estiverem em vigor no momento do facto tributário e de ter o dever de proceder à conversão das informações vinculativas ou de outro tipo de entendimento prestado aos con- tribuintes em circulares administrativas, em determinadas circunstâncias (n.º 3 do artigo 68.º da LGT), não altera esta perspetiva porque não transforma esse conteúdo em norma com eficácia externa. É certo que o administrado pode invocar, no confronto com a administração, o conteúdo da orientação administrativa publicitada e, se for o caso, fazê-lo valer perante os tribunais, mesmo com sacrifício do princípio da legalidade (cfr. Diogo Leite de Cam- pos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa,  Lei Geral Tributária, comentada e anotada, 3.ª edição, p. 344). Mas é ao abrigo do princípio da boa fé e da segurança jurídica, não pelo seu valor normativo, que o conteúdo das circulares prevalece. O administrado só as acata se e enquanto lhe convier, pelas mesmas razões que justificam que possa invocar informações individuais vinculativas que o favoreçam [artigo 59.º, n.º 3, alínea  e) e artigo 68.º da LGT]. Consequentemente, faltando-lhes força vinculativa heterónoma para os particulares e não se impondo ao juiz senão pelo valor doutrinário que porventura possuam, as prescrições contidas nas “circulares” da Administração Tributária não constituem normas para efeitos do sistema de controlo de constitucionalidade da competência do Tribunal Constitucional.» 11. Mas, mesmo que se entenda de outro modo, defendendo, como faz a recorrente, que as Circulares da Administração Fiscal comportam função tipificadora quando densificam ou determinam o espaço de regulação legal, vinculando não só a Administração, mas também os particulares e os Tribunais, intercede a ausência de outro pressuposto do recurso quanto às duas apontadas questões, em termos que dispensam o aprofundamento da temática que se vem de abordar. É que o modelo de atuação constante da Circular n.º 7/2004, e o sentido normativo que tem como suporte formal o n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, designada- mente o afastamento de método de afetação direta ou específica dos encargos financeiros às participação sociais e o acolhimento de método indireto, com imputação pro rata dos encargos financeiros incorridos aos diversos ativos detidos pela SGPS, não constituiu critério ou padrão normativo determinante do julgamento emitido na decisão recorrida, como exige a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. Com efeito, contrariamente ao que sustenta a recorrente, tal sentido normativo não foi aplicado, nem sancionado, pela decisão arbitral recorrida. Em termos claros, a decisão arbitral acolheu o método de afeta- ção direta dos encargos financeiros que a recorrente se propôs deduzir no exercício de IRC no ano de 2003

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