TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
236 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL D. Não lhe sendo razoavelmente exigível (nem aos demais contribuintes nas mesmas circunstâncias), quanto mais não fosse por força do próprio quadro constitucional aplicável (cfr. artigo 104.º, n.º 2, do CRP), que contasse com a possibilidade de mutação do mesmo no sentido em que esta veio a ocorrer (com efeitos logo a partir de 2003, na interpretação sancionada pela decisão arbitral) – i. e., no sentido do afastamento da consideração desses encargos (reais) no cômputo do lucro sujeito a imposto. E. Uma vez que ser ou não SGPS não é uma opção (cfr. artigo 8.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro), contrariamente ao que parece ter-se julgado na decisão arbitral recorrida, o regime temporal resul- tante da interpretação da norma relevante sancionada pela decisão arbitral recorrida viola, ainda, o princípio constitucional da proporcionalidade (cfr. artigo 2.º, e 18.º, n. os 2 e 3, da CRP). F. A norma constante do então (à data dos factos) artigo 31.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (atual artigo 32.º, n.º 2), que – na interpretação da Circular n.º 7/2004, de 30 de março, da DSIRC – impõe a indedutibilidade fiscal de encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital a priori, i. e. , logo que estes sejam incorridos, independentemente e desligadamente da (eventual) aplicabilidade futura de isenção prevista para as (também elas eventuais ou incertas) mais-valias geradas pelas partes de capital com que se conexionam os referidos encargos financeiros, é inconstitucional, por violação dos princípios da igual- dade, da neutralidade e da capacidade contributiva ou rendimento real, consagrados nos artigos 13.º (e 2.º, enquanto emanação do Estado de direito democrático), 103.º, n.º 1, e 104.º, n.º 2, da CRP, e do princípio da proporcionalidade que encontra expressão qualificada nos artigos 18.º, n. os 2 e 3, da CRP, e é uma emanação do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP). G. Impedir que um custo real, neste caso encargos financeiros (juros) associados ao financiamento da atividade da empresa – o investimento em, e detenção de, participações sociais –, seja tomado em linha de conta aquando do apuramento do lucro sujeito a imposto, equivale a tributar um rendimento fictício, inexistente. H. O eventual equilíbrio da situação (não deduz juros no cômputo do lucro sujeito a imposto mas em contra- partida não vê sujeito a imposto mais-valias com a alienação de participações sociais) terá de ser, pelo menos à partida (que não necessariamente à chegada), minimamente assegurado, sob pena de violação dos princípios da capacidade contributiva, da tributação do rendimento real e da igualdade e neutralidade (este dois últimos por via da comparação com sujeitos passivos “não SGPS”). E não é. I. Ou melhor, não é, na interpretação da norma constante do n.º 2 do artigo 31.º (atual 32.º) do EBF, preconi- zada pela Circular 7/2004, de 30 de março, da DSIRC, e sancionada pela decisão arbitral ora recorrida onde se prescreve que os encargos financeiros deverão ser afastados do cômputo do lucro sujeito a imposto “(...) independentemente de se encontrarem já reunidas todas as condições para a aplicação do regime especial de tributação das mais-valias”, não sendo pois os juros aqui em causa dedutíveis a rendimentos como os resultan- tes de prestações de serviços pelas SGPS, ao contrário das demais sociedades que poderão deduzir os juros aos seus (demais) rendimentos operacionais – de que são exemplo os rendimentos de prestações de serviços que as SGPS também estão autorizadas a prestar –, assim reduzindo o seu lucro tributável. J. Este desvio ao princípio da tributação do rendimento real e esta desigualdade de tratamento não se desvanecem pelo facto de a situação ser alegadamente temporária, i. e. , pelo facto de na interpretação da Circular o encargo financeiro poder ser considerado como custo fiscal “[q]uando se conclua, no momento da alienação das parti- cipações, que não se verificam todos os requisitos para a aplicação daquele regime de isenção de mais-valias]” (cfr. parágrafo 6 da referida Circular). L. Em primeiro lugar tais juros são indedutíveis mesmo na parte em que excedam as eventuais mais-valias que venham a ser comprovadamente isentas de tributação (isenção esta que legitimaria o afastamento da dedutibi- lidade desses gastos financeiros realmente suportados), isto num contexto, o do IRC, em que não há tributação por categorias de rendimentos, e não o há, portanto, para outros contribuintes que não sejam (por exercerem uma atividade económica direta) SGPS que detenham também participações sociais financiadas com dívida remunerada: estes gastos financeiros estão disponíveis para serem compensados com outros tipos de rendi- mentos destes outros contribuintes, que não apenas as mais-valias tributadas ou (em caso de reinvestimento) parcialmente isentas, o que ocorrerá, nocionalmente falando, sempre que superem o valor destas últimas.
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