TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
230 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL em que era de supor que uma tal advertência ainda produzisse efeitos inibidores. Mas o não cometimento de novos crimes nesse período de tempo só compreensivelmente releva, para efeitos de afastar a punição da reincidência, num pressuposto de liberdade. É que, só num contexto de relação com o outro, fora dos constrangimentos decorrentes da reclusão, se pode comprovadamente aferir da eficácia preventiva que a condenação penal transitada teve em relação ao agente. E se tal é possível em relação ao condenado em pena de prisão suspensa na execução, que, apesar da condenação, beneficia desse espaço de liberdade vivencial que marcadamente confere ao seu comportamento o sentido de um exercício de autodeterminação normativa, o mesmo já não acontece em relação a quem esteja sujeito a uma medida privativa da liberdade. A experiência de liberdade ou, com mais propriedade, a experimentação da liberdade, ainda que sob condição resolutiva (cometimento de um crime no período de suspensão da execução da pena de prisão) é, pois, assumida pelo legislador como indispensável para avaliar o comportamento do agente posterior à condenação e o efeito que esta, enquanto advertência que lhe é dirigida de que não deve, no futuro, cometer outros crimes, nele provocou (cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português. Parte Geral. II. As con- sequências jurídicas do crime, Aequitas. Editorial Notícias, 1993, p. 267). Por isso que, não estando o agente em liberdade, não corre o prazo cujo decurso determina a «prescrição» da reincidência enquanto fator de agravação da pena. A recorrente critica a solução legal por não se lhe afigurar justa. Mas não compete ao Tribunal Cons- titucional ajuizar da justiça ou razoabilidade dos critérios normativos adotados pelo legislador em ordem a aferir se, de entre o conjunto de medidas alternativas adotáveis, essa foi a melhor solução. O que apenas lhe cabe verificar, enquanto órgão de controlo da constitucionalidade das leis, é se a denunciada diferença de tratamento legal é arbitrária por não ter qualquer fundamento razoável ou por assentar em critérios que, por ininteligíveis ou insuscetíveis de apreensão racional, não possam, à luz da Constituição, justificar-se material- mente (cfr., entre outros, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 166/10). Não é manifestamente o caso, como se viu. A interrupção do prazo legal em causa em relação àqueles que se encontrem privados da liberdade tem, como acima demonstrado, razão de ser concordante com os valores constitucionais em presença, não consubstanciando, pois, solução que, por arbitrária, a Constituição não admite. 4. Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, a norma do n.º 2 do artigo 75.º do Código Penal, no segmento em que determina que no prazo de cinco anos nela previsto não é computado o tempo durante o qual o agente tenha cumprido medida processual, pena ou medida de segurança privativas da liberdade; b) Negar, em consequência, provimento ao recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta. Lisboa, 7 de janeiro de 2014. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Lino Rodri- gues Ribeiro – Maria Lúcia Amaral. Anotação: O Acórdão n. º 166/10 está publicado em Acórdãos, 77.º Vol..
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