TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL por força do cumprimento de pena de prisão, e não também os casos em que o agente foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, o que se impunha, na perspetiva da recorrente, atenta a identi- dade substancial das duas situações. Ora, conclui o Ministério Público, como a arguida foi anteriormente condenada em pena de prisão efetiva, que não em pena de prisão suspensa na sua execução, ainda que, na procedência do recurso, a norma em causa viesse a ser julgada inconstitucional, um tal juízo não implicaria qualquer modificação de julgado, por não se encontrar a arguida na situação jurídico-processual (condenação anterior em pena de prisão suspensa na sua execução) para que reclama, por força do invocado princípio da igualdade, idêntico tratamento normativo. Não se afigura, contudo, que assista razão ao Ministério Público. Com efeito, a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada é a do n.º 2 do artigo 75.º do CP, que prevê como requisito formal negativo de que depende a punição do agente como reincidente não ter decorrido mais de cinco anos entre a data da prática do crime anterior e a do crime seguinte, não computando, para efeitos da sua contagem, «o tempo durante o qual o agente tenha cumprido medida pro- cessual, pena ou medida de segurança privativas da liberdade». E é precisamente contra este último segmento da referida norma legal que a recorrente se insurge, pois que, a seu ver, não há nenhuma razão para que um tal prazo se suspenda durante o período em que o agente está em cumprimento de pena, não se valorando, para esse efeito, o bom comportamento prisional do agente, e decorra naquelas situações em que ao agente foi antes aplicada pena de prisão suspensa na sua execução. Independentemente da bondade das invocadas razões de inconstitucionalidade, que a seu tempo se apreciará, o certo é que a recorrente, contrariamente ao que parece pressupor o Ministério Público, não pre- tende que seja aditada à previsão legal, na parte em que não computa no aludido prazo o período de reclusão do agente, os casos de aplicação de pena de prisão suspensa na sua execução; o que pretende, ao invés, é afastar a aplicação dessa norma, nesse segmento, com fundamento em inconstitucionalidade, de modo a que o período de cumprimento da pena de prisão seja computado no referido prazo legal, tal como sucede com aqueles que, tendo também sido condenados em pena de prisão, viram a sua execução suspensa, valorando- -se, em ambos os casos, a circunstância de, durante esse período de tempo (5 anos), não ter o agente reinci- dido, sendo, pois, indiferente, na tese da recorrente, que, verificado esse pressuposto básico, o agente esteja ou não em contexto de reclusão. Ora, considerando o tempo decorrido desde a data da prática dos factos por que a arguida foi antes condenada, por decisão transitada, em pena de prisão efetiva (abril de 2006) e a data da prática dos factos que determinaram a sua condenação ulterior nestes autos (julho de 2012), há que concluir pela utilidade do recurso. De facto, a sua eventual procedência determinará modificação de julgado, pois que, em face do juízo de inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 75.º do CP, no segmento pertinente, deverá o tribunal recorrido computar no prazo de 5 anos a que alude a primeira parte dessa norma todo o período de tempo em que a recorrente esteve em cumprimento de pena (de 23 de outubro de 2007, data do trânsito em julgado da primeira condenação, até 19 de outubro de 2009, data em que lhe foi concedida liberdade condicional), afastando-se, desse modo, atento o transcurso desse prazo à data da prática do crime, objeto dos presentes autos, a sua punição como reincidente. Porém, justificando-se, pelas referidas razões, o conhecimento do recurso, não se descortina nas razões de inconstitucionalidade invocadas fundamento para a sua procedência. 3. A recorrente não adianta, desde logo, quer na motivação do recurso interposto no tribunal recorrido, quer nas alegações apresentadas no recurso de constitucionalidade ora em apreciação, quaisquer razões que sustentem a conclusão de que a norma em causa viola o complexo de garantias de defesa do arguido em pro- cesso criminal que o artigo 32.º da CRP assegura, não especificando, como lhe competia, qual em concreto a garantia constitucional de defesa que considera violada pela norma do artigo 75.º, n.º 2, do CP. Por outro lado, também não explica, como lhe era exigível, por que razão e em que medida esta norma viola os princí- pios constitucionais da legalidade e da proporcionalidade.

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