TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

204 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL lxxviii. Caso contrário, atropelam-se as legítimas expectativas e garantias dos contribuintes anteriormente constituídas, e o princípio da confiança e segurança jurídica, ínsitos ao princípio do Estado de Direito, além de ser violado o princípio geral da irretroatividade das leis, designadamente daquelas que são restritivas dos direitos, liberdades e garantias, previsto, entre outros, nos artigos 12.º da LGT, 12.º do CC e 103.º n.º 3 da CRP. lxxix. O artigo 49.º n.º 3 da LGT (na redação anterior à Lei n.º 100/99, de 26/7), enquanto lei “restritiva” de uma “garantia” dos contribuintes, se interpretado no sentido de que é aplicável a factos tributários e, por isso, a prazos prescricionais, ocorridos e iniciados anteriormente à sua entrada em vigor, padece de inconstitucionalidade material, por violação do primado da proteção da confiança e das garantias anteriormente constituídas, emergentes do ideal de segurança jurídica que subjaz ao princípio consti- tucional do Estado de Direito Democrático, e por violação do princípio fundamental da proibição da normas retroativas restritivas de garantias . lxxx. Refere o Tribunal a quo que o prazo de prescrição se suspendeu em virtude da apresentação, pela recor- rente, de oposição à execução fiscal – entre 14 de setembro de 2007 e 30 de novembro de 2009, enten- dendo, ainda, que o prazo de prescrição se suspendeu em virtude da apresentação, pela recorrente, de reclamação contra ato do órgão de execução fiscal. lxxxi. Não pode o Tribunal a quo conferir efeito suspensivo à prestação da garantia com a impugnação e, simultaneamente, atribuir-lhe o mesmo efeito, com o mesmo fundamento, pela apresentação de recla- mação e oposição. lxxxii. À data da prestação da garantia, 22 de julho de 1999, ainda não tinha cessado o efeito interruptivo da prescrição motivado pela apresentação da IJ (que só cessou em 8 de março de 2000), pelo que a pres- tação da garantia não pode voltar a interromper/suspender o prazo de prescrição. lxxxiii. Ainda que se admitisse a suspensão da contagem do prazo prescricional, pela apresentação, em 14 de setembro de 2007, de oposição à execução fiscal, contata-se que, nessa altura, já havia decorrido o prazo de prescrição. lxxxiv. Efetivamente, entre 1 de janeiro de 1994 até 8 de março de 1999 decorreram quatro anos e dois meses, e entre 8 de março de 2000 até 14 de setembro de 2007 decorreram sete anos e dois meses – o que perfaz o total de onze anos e quatro meses. lxxxv. Aliás, nunca poderia ser conferido efeito interruptivo à reclamação e, posteriormente, à oposição, por- quanto o artigo 49.º n.º 3 da LGT veio estabelecer que a interrupção se dá uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar. lxxxvi. A consideração de uma pluralidade de factos suspensivos/interruptivos do prazo de prescrição, viola frontalmente as razões de certeza e segurança jurídica que estão na base do regime da prescrição fiscal, a qual, a ser assim, se pode prolongar indefinidamente – em claro prejuízo do Contribuinte, e em vio- lação dos princípios da certeza e segurança jurídica lxxxvii. Também após a revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT, é virtualmente impossível ocorrer a pres- crição de uma dívida tributária, uma vez que i) se for prestada garantia, como o prazo de prescrição está interrompido até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo, no final desse processo a garantia será executada; ii) se não for prestada garantia, o processo segue para penhora e, após trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo, para venda. lxxxviii. Na interpretação da sentença recorrida, a prescrição, em matéria tributária, deixou de ser possível; é adiável ad eternum – contrariando todos os ideais de segurança e paz jurídica que estão, e sempre esti- veram, na génese do instituto da prescrição lxxxix. O artigo 49.º n.º 3 da LGT, é organicamente inconstitucional, já que a respetiva lei de autorização legislativa – artigo 2.º, alínea 18) da Lei n.º 41/98, de 4/8 – apenas facultava o encurtamento do prazo de prescrição e, não, na prática, o seu alargamento – que é, efetivamente, o que passou a suceder a suceder com essa “novidade” que foi passar a prever a suspensão do decurso do prazo de prescrição em consequência da suspensão do processo de execução fiscal.

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