TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

196 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL impliquem que sejam ‘tocadas’ relações ou situações que, até então, eram regidas de outra sorte”. “Sendo que só uma retroatividade intolerável, que afete de forma inadmissível e arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundados dos cidadãos, viola o princípio de proteção da confiança, ínsito na ideia do Estado de direito”. No caso em apreço, tal como se conclui no mencionado Acórdão, não se pode dizer que a afetação das expec- tativas do recorrente quanto ao cômputo do prazo da prescrição tenha sido arbitrária ou deva considerar-se dema- siado onerosa. Como pondera Jorge de Sousa (cfr. ob. cit. , p. 68), reportando-se à sucessão de regimes combinando causas de interrupção com causas de suspensão, “(…) compreende-se que o efeito interruptivo cesse por paragem do processo por mais de um ano por facto imputável ao contribuinte, pois essa paragem será imputável aos servi- ços estaduais que devem fazer tramitar atempadamente os processos administrativos e judiciais. Mas, também se compreende que, sendo o fundamento da prescrição das obrigações a negligência do credor em cobrar a dívida, não se deixe correr o prazo de prescrição enquanto estes credor está legalmente impossibilitado de providenciar no sentido de a cobrança ser efetuada”. A solução dada ao caso pela Mm.ª Juíza a quo também não se afigura intolerável e constitucionalmente inad- missível, pois tal só sucederia, voltando à jurisprudência do Tribunal Constitucional, vazada no Acórdão citado, se não houvesse fundamento material (um interesse público relevante) capaz de justificar a mutação operada na ordem jurídica – uma mutação que, então, se apresentaria como imprevisível e injustificada, não podendo os cidadãos contar com ela. Não se verifica, pois, a invocada inconstitucionalidade do sentido decisório da sentença recorrida, pelo que improcede, também, nesta parte, a argumentação da recorrente. Quanto à alegada inconstitucionalidade orgânica do n.º 3 do artigo 49.º da LGT […] O artigo 103.º da CRP ao estabelecer, no seu n.º 2, que “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”, procede, desta forma, à delimitação, do âmbito da reserva parlamentar no tocante aos impostos e aos seus elementos essenciais. Cumpre começar por realçar que sobre a questão de saber se esta reserva abrange os próprios prazos de pres- crição e de caducidade, como normas que delimitam poderes da Administração fiscal em relação aos direitos dos contribuintes, não existe sequer uniformidade na doutrina [Em sentido afirmativo, cfr. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 118. Em sentido contrário, cfr. Sérgio Vasques, ob. cit. , p. 283, nota (453)]. A questão não se coloca, porém, no caso em apreço, porque a lei de autorização da LGT (Lei 41/98, de 4/8), no artigo 2.º/17/18, autorizou o Governo a rever o prazo de prescrição das obrigações tributárias, podendo-os encurtar de modo consentâneo com as possibilidades e o aumento de eficiência da Administração e a rever os pressupostos da interrupção da prescrição. Ora, como bem sublinha a Mmª Juíza a quo “o legislador, através do artigo 48.º da LGT procedeu ao encurta- mento do prazo de prescrição previsto no regime anterior (CPT), de 10 para 8 anos, não se podendo inferir que a previsão de causas de suspensão (no n.º 3 do artigo 49.º) corresponde a um alargamento do prazo, pois o quantum do prazo prescricional e as causas de interrupção e suspensão constituem realidades diversas, estando, mesmo, sujeitas a regras distintas no que concerne à aplicação da lei no tempo”. “Efetivamente o n.º 3 do artigo 49.º não estabelece qualquer prazo de prescrição, apenas se limita a dispor sobre a suspensão do seu decurso, influindo, assim, no modus de contagem do prazo, mas não no prazo em si mesmo, não se afigurando poder concluir, como defende a Reclamante, que esse normativo alargou o prazo de prescrição”. Recorda, ainda, a Mmª Juíza a quo que no âmbito do CPT a simples instauração do processo de execução fiscal determinava um efeito interruptivo que se mantinha até ao termo do processo, efeito que deixou de existir com a LGT, dado que esta apenas atribui efeito suspensivo à paragem do processo de execução, enquanto esta se manti- ver inerte, deixando assim a instauração da execução de possuir qualquer efeito no decurso do prazo prescricional.

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