TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
178 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 90/90]. E por isso, ainda que idealmente separados para efeitos de um domínio específico, não deixam de constituir vantagens incluídas no posse de determinadas parcelas do domínio público marítimo, com possibilidade de rentabilização e exploração económica. Enquanto se mantêm ligados materialmente ao solo ou subsolo, os recursos minerais marinhos são par- tes integrantes desses bens naturais, divergindo a doutrina civilista, a propósito do direito de mineração, em categoriza-los como «frutos», «produtos» ou «partes da coisa-objeto»: para Manuel de Andrade, à luz do cri- tério do destino económico da coisa frutífera, «todos qualificam como frutos os minérios extraídos de minas em lavra regular (e analogamente para explorações semelhantes: pedreiras, etc.) – cfr. Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. I. Almedina, p. 268, nota 3); para Pires de Lima e Antunes Varela, «a extração de minério de uma mina, bem como da pedra de uma pedreira, por exemplo, apesar de afetar de algum modo a substância da coisa pode e deve ser considerada como uma colheita ou recolha de frutos» (cfr. Código Civil Anotado , Vol. I, p. 190); já para Oliveira Ascensão, o minério «é um produto da mina» ou uma parte ou produto «de uma coisa sobre a qual o Estado afirmou a sua titularidade», embora «o caráter continuado da extração e a lentidão do esgotamento trazem uma analogia com os frutos que leva a que se lhe aplique o regime traçado para estes» (cfr. Teoria Geral de Direito Civil, Vol. II, Lisboa, 1992, pp. 72 e 73 e Direitos Reais, Livraria Petrony, 1971, pp. 533 e 534). Da aproximação dos recursos minerais marinhos às categorias de «fruto» ou «produto» do solo ou sub- solo do mar territorial decorre: (i) a sua qualificação como coisas imóveis [cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 204.º do Código Civil]; (ii) e a atribuição do direito aos recursos minerais ao titular do respetivo direito de fruição (cfr. artigo 213.º do Código Civil). Ora, em princípio, o titular dos direitos de fruição, que fazem parte do conteúdo do domínio público marítimo, é o Estado. O Estado exerce-os nos mesmos termos em que o faz relativamente aos demais bens encontrados no leito do mar, embora não qualificados como dominiais. Relativamente a estes bens, como é o caso das areias ou dos objetos de valor histórico, arqueológico e artístico, o Tribunal Constitucional já se pronunciou pela sua pertença ao Estado, como «frutos da administração» do domínio público marítimo (Acórdãos n. os 280/90 e 330/99). 7.5. Mas o facto de o leito das águas territoriais e dos fundos marinhos contíguos ao arquipélago dos Açores e os recursos naturais neles integrados pertencerem ao domínio público do Estado, não impossibi- lita, do ponto de vista da Constituição, que alguns dos poderes de gestão desse domínio possam ser afetos à Região. O que o Estado não pode transmitir, seja a quem for, é a titularidade do domínio público marítimo, incluindo aí os poderes e prerrogativas que formam o núcleo essencial da dominialidade (os poderes de domínio), assim como a propriedade dos recursos naturais nele situados, enquanto não se produzir a desafe- tação ou separação. A ilação que se extrai da estadualidade do domínio público marítimo é que os bens que o integram são, pela sua natureza, insuscetíveis de transferência para particulares ou para outras entidades públicas. Como refere a jurisprudência deste tribunal, por força do princípio da unidade do Estado, o legis- lador está proibido constitucionalmente de transferir para as regiões autónomas bens integrados no domínio público marítimo (cfr. Acórdãos n.º 330/99, n.º 131/03 e n.º 402/08). E a mesma proibição vale quanto à propriedade dos recursos naturais integrados no domínio púbico marítimo, enquanto não se produzir a desafetação ou separação do leito do mar ou do respetivo subsolo. A inalienabilidade desta espécie de bens está expressamente prevista no artigo 2.º da Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho (alterada pelas Leis n.º 17/2012, de 26 de abril e n.º 35/2013, de 11 de junho), que regula o acesso da iniciativa económica privada a determinadas atividades económicas: «a exploração dos recursos do subsolo e dos outros recursos naturais que, nos termos constitucionais, são pertencentes ao Estado será sempre sujeita ao regime de concessão ou outro que não envolva a transmissão de propriedade dos recursos a explorar , mesmo quando a referida exploração seja realizada por empresas do setor público ou de economia mista» (itálico nosso).
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