TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
126 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL relativamente à pensão, desde que o montante da pensão sobrante não seja inferior ao mencionado valor, por maioria de razão, quem sofre de uma redução das capacidades de trabalho menos gravosa (designadamente de uma incapacidade permanente parcial inferior a 30%) deve igualmente poder exercer a sua autonomia de vontade relativamente à pensão vitalícia, desde que se continuem a aplicar os mesmos limites quanto à pensão sobrante. Isto é, não se vislumbra, em face do interesse tutelado pela definição do limite atinente à pensão sobrante, nenhum motivo materialmente fundado para que assim não seja. No que se refere ao respeito da exigência de que o capital da remição não seja superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30% – prevista na alínea b) –, a mesma estará sempre, e à partida, assegurada no caso da remição de pensões vitalícias correspondentes a uma incapacidade permanente parcial inferior a 30%. É que, não só a remição é por força do corpo do n.º 2 do artigo 75.º necessariamente parcial, como ainda tem de respeitar o limite máximo correspondente ao valor da pensão sobrante exigido pela alínea a) do mesmo número. Por outro lado, no tocante a esta segunda alínea também não é pertinente argumentar com eventuais problemas de gestão das seguradoras, atenta a consideração de que a racionalidade económica de um seguro pressupõe o pagamento periódico de uma renda ou pensão, já que o seguro consiste grosso modo em a seguradora aplicar uma parte do capital dos prémios, em termos de gerar um rendimento que lhe permita satisfazer as futuras pensões e que a remição ficciona a transferência dessa racionalidade para o sinistrado, através da entrega de um determinado capital. Com efeito, o problema põe-se igualmente – e até com maior acuidade – no caso da remição parcial de pensões vitalícias correspondentes a incapacidades permanentes parciais iguais ou superiores a 30%. Em suma, os fins que subjazem às condições que restringem a faculdade de remição parcial de pensões vitalícias a pedido do sinistrado, nos termos do artigo 75.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009, são menos prementes no caso de incapacidades permanentes parciais inferiores a 30% do que no caso em que tais incapacidades sejam iguais ou ultrapassem tal limiar. Consequentemente, fica por justificar materialmente a permissão legal de remição parcial facultativa neste segundo caso e a sua proibição legal (indireta) no primeiro caso. 8. Tal diferença de tratamento suscita um problema quanto à compreensibilidade, razoabilidade ou não arbitrariedade entre os dois tipos de situação, diferença essa que se pode repercutir, como sucedeu nos casos objeto das decisões que constituem o pressuposto da presente generalização, em tratamento desigual e discriminatório de situações subjetivas merecedoras de idêntica tutela. Com efeito, valem aqui também as considerações feitas no Acórdão deste Tribunal n.º 546/11 no tocante ao princípio da igualdade, plasmado no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição: «[É] ponto assente que o n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque inte- grantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto – e veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 232/03, disponível em www.tribunalconstitucional.pt – que o carácter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, “racionais”. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do “merecimento” – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face a ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz cons- titucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador. Fora destas circunstâncias, e, nomeadamente, sempre que estiver em causa a simples verificação de uma menor “racionalidade” ou congruência interna de um sis- tema legal, que contudo se não repercuta no trato diverso – e desrazoavelmente diverso, no sentido acima exposto
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