TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
111 acórdão n.º 171/14 que suportam o pedido de generalização deduzido (Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 74/88 e 83/01, e, na doutrina, Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional , Coimbra, 2010, p. 313). No caso em apreço, o magistrado do Ministério Público requereu, em processos autónomos, a generali- zação do juízo de inconstitucionalidade em relação a duas diferentes interpretações normativas do artigo 8.º, n.º 7, do Regime Geral das Infrações Tributárias, relativamente a cada uma das quais se verifica o requisito processual de repetição do julgado mencionado no artigo 82.º da LTC. No Acórdão n. os 1/13 e em diversas decisões sumárias que se lhe seguiram, o Tribunal julgou inconstitu- cional a norma do artigo 8.º, n.º 7, do Regime Geral das Infrações Tributárias, quando aplicável a gerente de uma pessoa coletiva que foi igualmente condenado a título pessoal pela prática da mesma infração tributária, utilizando como parâmetro o princípio ne bis in idem consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da Constituição. No Acórdão n.º 297/13, em juízo reiterado pelo Acórdão n.º 354/13 e decisões sumárias subsequen- tes, ainda que aí estivesse também em causa uma condenação, a título pessoal, do responsável da sociedade comercial a par da condenação da própria pessoa coletiva, pela prática, em coautoria material, de um crime de abuso de confiança fiscal, o Tribunal julgou inconstitucional a mesma a norma do artigo 8.º, n.º 7, do Regime Geral das Infrações Tributárias, na parte em que se refere à responsabilidade solidária dos gerentes e administradores de uma sociedade que hajam colaborado dolosamente na prática de infração tributária pelas multas aplicadas à sociedade, neste caso por violação do princípio da não transmissibilidade das penas previsto no artigo 30.º, n.º 3, da Constituição. No primeiro caso, a dimensão interpretativa analisada pressupõe uma cumulação da responsabilidade penal própria do gerente com a responsabilidade solidária pelo cumprimento da sanção penal pecuniária imposta à pessoa coletiva, implicando uma dupla valoração jurídico-criminal de um mesmo facto em relação ao mesmo agente, que é tido como condevedor da prestação devida pela pessoa coletiva, a título de respon- sabilidade solidária. No segundo caso, a interpretação normativa declarada inconstitucional reporta-se à extensão da respon- sabilidade sancionatória da pessoa coletiva a um outro sujeito jurídico, pelo que a ratio decidendi do juízo de inconstitucionalidade entronca, não na atribuição de diferentes consequências sancionatórias relativamente ao mesmo facto ilícito mas sim na previsão de que a pena recaia sobre pessoa diferente da que praticou o facto que lhe serve de fundamento (em virtude de ter colaborado dolosamente na prática da infração). E sem dúvida que a questionada norma do n.º 7 do artigo 8.º do RGIT comporta estas duas dimensões interpretativas, ao dispor que «[q]uem colaborar dolosamente na prática de infração tributária é solidaria- mente responsável pelas multas e coimas aplicadas pela prática da infração, independentemente da sua res- ponsabilidade pela infração, quando for o caso». Prevê-se aí uma responsabilidade solidária, que permite que o pagamento das multas e coimas aplicáveis à pessoa coletiva no âmbito do respetivo processo criminal ou contraordenacional possa ser diretamente exigido ao devedor solidário. A obrigação incide sobre aquele que presta colaboração dolosa e é cumulativa com a própria responsabilidade pessoal que dessa conduta possa resultar para o agente. Como se depreende, porém, do disposto no segmento final do preceito, não é necessário que a conduta daquele que colabora na infração seja penal ou contraordenacionalmente punível (cfr. Jorge Lopes de Sousa/Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infrações Tributárias Anotado, 3.ª edição, Lisboa, pp. 102-103). O que significa que o devedor pode apenas responder solidariamente pela multa ou coima que tenha sido aplicada à pessoa coletiva ou responder solidariamente por essa multa ou coima, em cumulação com a responsabilidade individual que lhe seja imputável em função da sua própria comparticipação na infração. Verifica-se, assim, que a norma do artigo 8.º, n.º 7, do RGIT, na parte em que se refere à responsabili- dade solidária dos gerentes e administradores de uma sociedade que hajam colaborado dolosamente na prá- tica de infração tributária pelas multas aplicadas à sociedade abrange os casos em que, por efeito dessa mesma
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