TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
106 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Problema idêntico foi já apreciado pelo Tribunal Constitucional, que afirmou no seu Acórdão n.º 187/12: «O Estatuto Político-Administrativo é a lei básica da região, que, dentro do quadro constitucional, regula o modo de organização e de exercício do poder autonómico, definindo as competências e inter-relações entre os órgãos de governo próprio da região e o estatuto dos seus titulares (artigo 231.º). As normas que integram esta lei básica, e que completam o quadro constitucional de repartição de competências entre legislador nacional e legisla- dor regional, detêm, pelo lugar, hierárquico e funcional, que a Constituição lhe atribui – e pela função substancial que cumprem, de serem a primeira expressão da autonomia político-legislativa da região: artigo 6.º, n.º 2, da CRP – legitimidade bastante para serem elas próprias “normas distribuidoras” de tarefas no seio da região, enunciando as matérias que, sendo reservadas à função reguladora do legislador regional, ficam subtraídas, na região, à regula- ção administrativa.» Como acima se deu conta, à luz do artigo 39.º do EPARAM, compete à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, no exercício de funções regulamentares, proceder à regulamentação das leis gerais emanadas dos órgãos de soberania – não sendo atribuída ao Governo Regional, pelo artigo 69.º do Estatuto, competência para proceder a tal regulamentação. Pelo que, inexistindo norma habilitante para a aprovação do Decreto Regulamentar Regional em causa pelo Governo Regional, tal bastaria prima facie para concluir pela ilegalidade das suas normas. Verifica-se todavia, in casu , que o vício em presença se afigura outro, mais grave, na medida em que se mostra afetada a própria reserva de competência legislativa da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira e, assim, a reserva de lei em favor do legislador regional – a que os requerentes não deixam de aludir. Com efeito, apesar de a fundamentação dos requerentes ser alicerçada, no essencial, na exclusividade da competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma em causa para regulamentar as leis emana- das dos órgãos de soberania que não reservem para estes o respetivo poder regulamentar [artigos 39.º do EPARAM e 227.º, n.º 1, alínea d) , segunda parte, e 232.º, n.º 1, da CRP], aqueles referem igualmente, no quadro da estrutura orgânica regional, a exclusividade do poder legislativo daquela Assembleia Legislativa (cfr. requerimento, 5.º). A este propósito, afigura-se adequado recordar o que este Tribunal sustentou no mencionado Acórdão n.º 187/12: «As relações que, nas regiões, se estabelecem entre o poder legislativo e o poder executivo não replicam aquelas outras que, na República, se estabelecem entre Parlamento e Governo. Por razões que se prendem, afinal, com os fundamentos da própria autonomia regional (artigo 225.º), na região a assembleia legislativa, de base eletiva, detém uma reserva de competência face ao governo regional que, sendo bem mais vasta do que a reserva homóloga da Assembleia da República, abarca não apenas todas as competências legislativas da região, mas também certos dos seus poderes regulamentares, bem como as suas competências de iniciativa legislativa (artigo 232.º, n.º 1). É por estes motivos que se conclui que a CRP não impede que se entenda que as normas dos estatutos que enunciam as matérias sobre as quais a região pode legislar são normas que têm por efeito a constituição, na ordem interna dessa região, de reservas de lei a favor do legislador regional. (...) Resta no entanto determinar qual a extensão que deve ter esta reserva de lei. (...) A extensão de uma reserva especial de lei pode ter gradações diversas, consoante a específica matéria sobre a qual incida. Todavia, tanto a jurisprudência (veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 289/04, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) quanto a doutrina (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Por- tuguesa Anotada, 4.ª edição, Vol. II, Coimbra 2010, p. 70) são unânimes em considerar que, aí onde houver reser- vas de lei, ao ato legislativo caberá sempre, e pelo menos, fixar “o sentido e os limites da intervenção regulamentar”
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=