TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

99 acórdão n.º 474/13 Colectivo no Dimensionamento da Empresa, 2000, p. 273), por forma a reduzir ao mínimo ou tornar infre- quentes a situação de perda de emprego e as consequências sociais fortemente danosas que acarreta. Entre a ponderação de eficiência e eficácia da Administração Pública e o respeito pelos direitos e garan- tias dos particulares não existe antinomia. O princípio da prossecução do interesse público – o “norte da Administração Pública”, na expressão de Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos (cfr. Direito Admi- nistrativo Geral, Tomo I, 2004, p. 201) – , e o princípio da boa administração, sua decorrência, convocam igualmente valores e parâmetros exteriores à esfera jurídica, em que inscrevem necessariamente os princípios de gestão e de racionalidade económico-financeira, sem que daí decorra o afastamento do primado da juri- dicidade. Como diz Mário Aroso de Almeida: «(…) não é boa a administração que, embora no respeito pelas exigências formais que o ordenamento lhe impõe, não assegure a eficaz e eficiente satisfação das necessidades postas a seu cargo. Mas a dimensão do respeito pelos direitos dos particulares não deixa igualmente de ser vista como uma das dimensões da boa administração num Estado de direito democrático, pelo que também não é boa a administração que, embora sendo porventura eficaz na prossecução dos seus fins, o faça sem observância das exigências que o ordenamento jurídico lhe impõe e, em particular daquelas que decorrem do dever de respeito pelos direitos e interesses dos particulares” (cfr. Teoria Geral do Direito Administrativo: Temas Nucleares , 2012, p. 70).  Importa dizer que o oferecimento das razões de interesse público que justificam a medida constitui ónus do legislador. Impõe-se aqui de forma acrescida, pela força das expectativas que contraria e sobretudo pela intensidade do grau de afetação que opera para todo um grupo de trabalhadores, muitos deles com dezenas de anos de serviço na Administração Pública. O legislador carece de demonstrar, nos planos da adequação, necessidade e justa medida, que a intervenção funda e não transitória que opera responde a exigências da Administração Pública, em especial perante a adstrição decorrente do artigo 266.º da Constituição. Ora, a exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 154/XII/2.ª nada diz a este propósito. Refere tão somente que o regime de mobilização especial, por não comportar limite temporal máximo, levava em mui- tos casos à ausência de ligação ou de apelo para o regresso ao exercício de funções na Administração Pública e impedia a aplicação de processos de reforma e racionalização. Por outro lado, o relatório elaborado pela Comissão Europeia em junho de 2013, no âmbito da 7.ª avaliação do Programa de Assistência Financeira – e em que se inscreve igualmente a 7.ª revisão do Memo- rando de Entendimento sobre as Condicionantes de Política Económica, referido na mesma exposição de motivos – , oferece visão mais ampla da aplicação do regime de mobilidade especial e concretiza as razões para a sua reduzida expressão numérica. Em quadro intitulado necessidade de reforma na Administração Pública, depois de comparar os dados do emprego público com outros Estados Membros da União Europeia, diz-se que o sistema de mobilidade especial constitui a única forma de realocar trabalhadores com desem- penho insatisfatório (underperforming employees) na sequência de processo de reorganização. Para além da referência a que os trabalhadores em mobilidade especial continuam a receber metade do seu salário após a permanência no sistema e sem outro prazo, para além do da reforma, indica-se que no final de 2012 estavam nessa situação 1 108 trabalhadores, o que será causado – diz esse relatório – pela ausência de incentivo dos dirigentes para propor trabalhadores a integrar no sistema, em virtude da perda do posto de trabalho cor- respondente e da alteração das regras de mobilidade (cfr. p. 27; documento acessível em ec.europa.eu ou em www.bportugal.pt ). Para além desses diagnósticos, que remetem para a necessidade de substituição do regime de mobilidade, mostra-se ausente da exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 154/XII/2.ª e dos respetivos trabalhos preparatórios, qualquer razão objetiva específica para a revogação da norma de salvaguarda do n.º 4 do artigo 88.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.

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