TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
92 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «(…) a) Motivos de mercado – redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado; b) Motivos estruturais – desequilíbrio económico-financeiro, mudança de atividade, reestruturação da orga- nização produtiva ou substituição de produtos dominantes; c) Motivos tecnológicos – alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automati- zação de meios de comunicação.» Aliás, existe clara similitude entre essas figuras juslaborais, em particular os motivos estruturais, e a causa de cessação da relação de emprego público que se encontra alojada no regime da requalificação, todas marcadaspor uma cadeia de decisões do empregador, situadas em diferentes níveis mas causalmente interli- gadas: uma decisão gestionária inicial; uma decisão organizativa intermédia e uma decisão contratual “final” (cfr. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 2012, p. 510). A averiguação de justa causa para o despedi- mento objetivo haverá que ser feita com referência a cada um desses elementos. Cabe atentar, neste ponto, que tem dominado na doutrina o entendimento de que o mérito económico de tais decisões gestionárias não se encontra, no quadro do Código do Trabalho, no perímetro de sindicância dos Tribunais, na medida em que o empresário goza de liberdade empresarial, podendo, no limite, como diz Pedro Martinez, “empreender um caminho ruinoso” (cfr. Direito do Trabalho, 2013, p. 928. Nesse sentido, igualmente António Monteiro Fernandes, ob. cit. , p. 522; Maria do Rosário Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, II, 2012, p. 883 e Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 2012, p. 279. Posição diversa defende Júlio Gomes, que considera esse entendimento praticamente impossível de conciliar com a exigência constitucional de justa causa, cfr. Direito do Trabalho, I, 2007, pp. 991 a 996). Mas, mesmo quem o defende, considera que não há que confundir essa margem de decisão com despedimento não fundamen- tado, ad nutum , pois sempre cumprirá verificar se o empregador não se encontra a agir em abuso de direito ou se o motivo não foi ficticiamente criado. A atuação da Administração Pública suscita outra ordem de ponderações, determinadas pela vinculação constante do artigo 266.º da Constituição à prossecução do interesse público – de que o princípio da boa administração é decorrência – e ao cumprimento dos princípios de igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e da boa fé, a que se juntam as garantias procedimentais conferidas na lei aos particulares em defesa de agressões estaduais. Mesmo que assim seja, como é, dessa adstrição não resulta valoração distinta do direito fundamental ao emprego e intensidade menor do quadro constitucional que protege o trabalhador (público) do despedimento arbitrário, como, aliás, o Tribunal sempre afirmou. As exigências substantivas e procedimentais que recaem sobre o despedimento por razões objetivas afirmam-se igualmente no espaço de atuação pública e privada. Como observa Júlio Gomes, “[p]ara o atin- gido é, em última análise, irrelevante saber se o poder jurídico é exercido pelo Estado ou por um particular” ( ob. cit. , p. 946, nota 2278), além de que “o interesse público é posto e não pressuposto” da atuação estadual (J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , II, p. 796). Cabe ao legislador vincular normativamente o exercício da discricionariedade do empregador público e à Administração Pública demonstrar a adequação das razões objetivas de interesse público que determinam e justificam, em ponderação, a restrição do direito fundamental ao emprego. A densidade de controlo em matéria de cessação da relação jurídica de emprego imposta pelo artigo 53.º da Constituição, quer no plano substantivo, quer no plano procedimental, não consente, pois, que o legislador confira ao empregador público, pela indeterminação da legislação que edita, como aqui acontece, a capacidade primária de concretizar os critérios normativos da requalificação por razões orçamentais e assim definir e criar livremente os próprios pressupostos da atuação que conduz ao despedimento. Qualquer que seja o empregador, o legislador democrático, por imposição do artigo 53.º
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