TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
90 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e finalmente que permitam aos tribunais um controlo objectivo efectivo da adequação das concretas actuações da Administração face ao conteúdo da norma legal que esteve na sua base e origem.» Incumbe ao Estado inscrever na lei critérios claros, precisos e seguros de decisão, em termos de confe- rir à atuação da Administração espaço concretizado de vinculação – e não de volição primária – através da identificação de um núcleo relevante para legitimar a intervenção restritiva do direito, liberdade e garantia afetado. Como, igualmente, permitir o controlo judicial da (eventual) ausência de critérios de gestão e a proporcionalidade das suas consequências face à lesão profunda do direito à segurança no emprego que pode acarretar. Essa concretização encontra-se ausente do segmento em apreço. Mormente, o aplicador-intérprete não apreende da normação em questão se o critério de ponderação imposto pelo legislador ultrapassa o plano meramente conjuntural, flutuando anualmente apenas em função de decisões políticas prévias quanto ao financiamento alocado a determinado órgão ou serviço a que, como refere o requerente, pode seguir-se, igualmente por decisão de índole política, a reposição (ou até o acrés- cimo) no ano seguinte do nível de transferências do Estado. Neste prisma, o sistema trazido pelo Decreto n.º 177/XII comporta uma insuprível margem de indeterminação sobre a suficiência de razões transitórias, que coloquem a decisão no perímetro da redução de efetivos apenas ao serviço da diminuição imediata e pontual de custos, e não da identificação de disfunções profundas, estruturais, que só se corrigem com intervenção duradoura (tanto quanto imponha a gestão racional) no plano dos recursos humanos. Apenas as segundas, e não as primeiras, encontram legitimação como racionalização de efetivos. Essa ausência de clareza encontra subsídio ainda na consideração de que o Decreto-Lei n.º 200/2006, de 25 de outubro, já permite, no quadro do atual regime de mobilidade especial, dar resposta gestionária a tais disfunções estruturais, aí necessariamente apoiada em instrumentos analíticos de gestão. Esta ordem de considerações encontra ainda maior procedência quando ponderamos o elemento “redu- ção de receitas próprias”, igualmente acolhido como fundamento da decisão de requalificação (e mediata- mente da cessação da relação de emprego público). Comportando por natureza o exercício orçamental uma dimensão prospetiva, revestida de inelutável aleatoriedade, o legislador não precisou o padrão relacional de aferição da redução de receitas próprias relevante, podendo perspetivar-se diversas soluções: aquelas efeti- vamente percebidas no último exercício orçamental; as receitas que o dirigente do serviço projeta auferir, ou, ainda, as receitas que sejam vinculativamente inscritas no orçamento por força de regras contabilísticas anualmente dimanadas da Direção Geral do Orçamento. A título de ilustração, veja-se a recente circular da Direção Geral do Orçamento n.º 1374, de 9 de agosto, em que se determina, tendo em vista a elaboração da proposta de Orçamento do Estado para 2014, que: «(…) 7. As entidades financiadas no todo ou em parte com receitas próprias ou consignadas (com exclusão de fundos europeus e transferências provenientes de outros subsetores) devem, independentemente dos valores que preveem cobrar no ano de 2014, apresentar as suas propostas de orçamento com uma redução na despesa a realizar com essas verbas, de acordo com os efeitos das medidas de contenção orçamental determinadas pelo Governo e respeitando a redução fixada para cada Programa Orçamental. 8. Da regra acima referida deve resultar um orçamento superavitário pelo menos no montante das referidas reduções, e uma previsão de receita não superior ao valor da receita cobrada em 2012.» (acessível e m www.dgo.pt ) Importa acrescentar que, pese embora o exercício de elaboração orçamental seja informado pelo princí- pio da transparência, não deixa de constituir domínio altamente complexo e especializado, de difícil apreen- sibilidade na busca de explicações intrínsecas ou extrínsecas a partir de variação nominal anual, sobretudo em orçamentos de grande volume económico. Neste quadro, não se vislumbra como podem os Tribunais, chamados a dirimir conflito sobre a legali- dade da conduta da Administração Pública na determinação de abertura de procedimento de requalificação,
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