TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

63 acórdão n.º 474/13 definir e criar livremente os próprios pressupostos da atuação que conduz ao despedimento; qualquer que seja o empregador, o legislador democrático, por imposição do artigo 53.º da Constituição, não pode deixar de assegurar o controlo do excesso no despedimento objetivo através do confronto entre o escopo da medida e as suas consequências, o que não acontece com a normação contida na segunda parte do n.º 2 do artigo 4.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º, ambos do Decreto n.º 177/XII, pelo que, e porque estamos perante norma restritiva de direitos, liberdades e garantias, a solução legislativa em presença mostra-se desproporcionada face aos direitos e interesses protegidos e conduz à conclusão pela sua desconformidade constitucional face ao disposto nos artigos 53.º e 18.º, n.º 2, da Constituição. VIII– Grande parte das considerações supra valem também no que respeita aos segmentos terceiro e quarto do n.º 2 artigo 4.º: “necessidade de requalificação dos respetivos trabalhadores para a sua adequação às atribuições ou objetivos definidos” e “cumprimento da estratégia estabelecida”; acresce que a inclusão do elemento “necessidade de requalificação” na fixação dos motivos para concluir precisamente por essa necessidade comporta alguma equivocidade, pois, numa primeira análise, remete para fatores subjetivos, imputáveis a inadaptação da força laboral a mudanças funcionais, e não para o plano obje- tivo; todavia, a menção plural aos “respetivos trabalhadores” afasta essa leitura e remete o elemento nuclear desse fundamento de requalificação para o desencontro entre os trabalhadores, abstratamente considerados, e as “atribuições ou objetivos definidos”. IX – O mesmo acontece com o último segmento do preceituado no n.º 2 do artigo 4.º, em que o referente normativo é integrado pela “estratégia estabelecida”, não se encontrando no diploma nenhum ele- mento concretizador ou remissão quanto aos critérios específicos que norteiam a elaboração – e quem os define – desses “objetivos” e “estratégia”, nem o respetivo suporte, em termos que garantam aos trabalhadores a sua cognição; como, do mesmo jeito, quais os parâmetros do desvio que legitimam o impulso de requalificação, o que incapacita o seu controlo, desde logo na dimensão da adequação do princípio da proporcionalidade. X – Como o Tribunal já referiu quanto às causas objetivas de cessação do vínculo laboral: “a garantia cons- titucional da segurança no emprego exige aqui que o «direito do sistema» seja já, na medida do possí- vel, «direito do problema», direito operativo e não regulação aberta capaz de potenciar despedimentos arbitrários, judicialmente incontroláveis”, função essa, de direito operativo, que não se encontra aqui respeitada, impondo a conclusão pela desconformidade constitucional da normação contida nos seg- mentos terceiro e quarto do n.º 2 do artigo 4.º, articulada com o n.º 2 do artigo 18.º, por violação conjugada dos princípios da justa causa do despedimento e da proporcionalidade. XI – Quanto à segunda questão de constitucionalidade, a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o princípio da confiança encontra-se sobretudo sedimentada em casos, como o presente, em que trata de sindicar a conformidade constitucional de normas retrospetivas, ou seja, de lei nova que se aplica a factos novos, ocorrendo anteriormente facto ou factos que criavam expectativas jurídicas, tendo a ideia de arbi- trariedade ou de excessiva onerosidade que o princípio da confiança tutela, enquanto vertente da segu- rança jurídica, sido operada pelo Tribunal Constitucional por referência a dois pressupostos essenciais: a afetação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possa contar; e ainda quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionali- dade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias).

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