TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

587 acórdão n.º 441/13 relativamente ao vínculo de filiação em questão, o que faz pesar ainda mais o interesse da proteção da família constituída e o direito à identidade pessoal do próprio filho. Além desta diferença, o prazo de três anos para o marido intentar a ação de impugnação da paternidade conta-se desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade, prevendo-se um termo inicial subjetivo, ao passo que o prazo da mãe é contado a partir do nascimento do filho. Trata-se, porém, de um termo inicial que só aparentemente é objetivo e de um prazo de duração que é efetivamente superior a três anos. O prazo é contado do facto objetivo do nascimento, pelo «motivo óbvio de, com toda a probabilidade, a mãe saber do nascimento no próprio ato do nascimento» (Pereira Coelho/ Guilherme de Oliveira, ob. cit. , p. 136), mas está aqui também naturalmente pressuposto que «a mãe do menor não poderá razoavelmente ignorar a inexistência do vínculo biológico por parte do marido» (Acór- dão n.º 589/07) ou não poderá deixar de razoavelmente duvidar da existência de tal vínculo. Em qualquer caso, sempre por referência a momento anterior ao do nascimento do filho, podendo mesmo afirmar-se que anteriormente a este fato objetivo a mãe teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a não paternidade do marido. Contrariamente ao alegado pelo Ministério Público (conclusão 63.º), a fixação de um prazo de caducidade de três anos, apesar de contados do nascimento do filho, toma em consideração o momento em que a mãe tomou conhecimento de que o marido poderia não ser o pai biológico do filho. E pela “natureza das coisas”, a mãe conhece necessariamente factos indiciadores (ou conclusivos) da não pater- nidade do marido, por referência a momento anterior ao nascimento do filho. O termo inicial previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 1842.º do CC, na medida em que só aparen- temente é objetivo, não impede a conclusão de que também a mãe tem uma oportunidade efetiva, atenta a duração do prazo legalmente estabelecido, de impugnar a paternidade presumida do marido, obstando a que relativamente a ela se afirme o que não é verdade. Retomando as palavras do Acórdão n.º 446/10, há uma oportunidade efetiva que autoriza a atribuir valor significante à inércia da mãe, em sentido abdicativo do direito a impugnar, ou, no mínimo, a dirigir-lhe uma imputação de auto-responsabilidade. É de concluir, atento o direito e o interesse constitucionalmente protegido a salvaguardar, que estamos perante a afetação de uma posição jurídica subjetiva tutelada pelo artigo 26.º, n.º 1, da CRP que não é desa- dequada, desnecessária nem tão-pouco desproporcionada. 9. Acresce que o regime legal de afastamento da presunção de paternidade de filho de mulher casada, constante dos artigos 1832.º, n. os 1, 2 e 3, do CC e 119.º, n.º 1, do Código do Registo Civil, abona no sentido de haver uma oportunidade efetiva de a mãe obstar a que se afirme que o filho é do marido, sendo esta uma outra via de tutela do direito à identidade pessoal da mãe. Pode fazer a declaração do nascimento com a indicação de que o filho não é do marido, o que faz cessar a presunção de paternidade, podendo até, desde logo, ser aceite o reconhecimento voluntário da paternidade. Isto é: antes de afastar a presunção, a mãe pode evitar que a paternidade do marido conste do registo. E as últimas alterações legislativas mostram que o regime legal do afastamento daquela presunção confere à mãe um meio expedito e efetivo de obviar a que a paternidade do marido conste do registo. A cessação da presunção de paternidade deixou de depender do averbamento no registo de declaração (judicial) de que, na ocasião do nascimento, o filho não beneficiou de posse de estado relativamente a ambos os cônjuges, com a consequência de haver menção oficiosa da pater- nidade do marido da mãe, caso o pedido fosse indeferido ou caso não provasse que pediu a declaração (cfr. artigo 1832.º, n. os 2 e 3, na redação anterior a 2001). Além disso, o marido deixou de ser notificado para, querendo, impugnar a paternidade constante do registo ou efetuar a perfilhação, sendo aquela omissa (cfr. artigo 119.º, n.º 3, do Código do Registo Civil, na redação do Decreto-Lei n.º 273/2001, de 13 de outubro, revogado pelo Decreto-Lei n.º 324/2007, de 28 de setembro). 10. Há que concluir que não há qualquer imposição constitucional no sentido da imprescritibilidade da ação de impugnação da paternidade presumida do marido, não obstante ser de reconhecer o direito funda- mental à identidade pessoal da mãe (artigo 26.º, n.º 1, da CRP). E que o estabelecimento do prazo de três

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