TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
569 acórdão n.º 428/13 Da aplicação do artigo 381.º, n.º 1, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro não resulta qualquer limitação ao poder condenatório do Juiz, convocando o mesmo a proferir uma condenação que não está na sua competência normal aplicar – note-se que em Portugal antes desta alteração todas as condenações superiores a cinco anos eram sempre aplicadas por um tribunal coletivo ou de júri. Assim, tendo por base um flagrante delito e a subsequente utilização de processo sumário, passa a considerar-se a possibilidade de um Juiz singular aplicar uma pena superior a cinco anos. Portanto, num processo sumário – perante tribunal singular – já de si com menos garantias para o arguido – e iminentemente marcado pela celeridade – pode resultar uma pena superior a cinco anos de prisão, para mais a aplicar por um único juiz cuja competência usual se circunscreve ao julgamento de crimes dos quais não venham a resultar uma condenação superior a cinco anos de prisão – mesmo o juiz de Círculo apenas pode aplicar penas superiores a cinco anos de prisão no âmbito de tribunal coletivo ou de júri. Não se olvida que o arguido sempre disporá de recurso da condenação em processo sumário. Porém, este constitui um remédio para os erros. (Um meio complementar de defesa) e não um novo julgamento, cujo decurso poderá estar inquinado pelo encurtamento da defesa do arguido, no âmbito de um processo em que a deliberação sobre as questões, além das incidentais ou prévias, da culpabilidade e da determinação da sanção foram realizados, num quadro de uma pena máxima superior a cinco anos de prisão, por um único juiz, que, fora do processo sumá- rio, não se compreendem não sua competência e estariam reservadas ao tribunal coletivo ou de júri. Os casos de flagrante delito não conduzem, só por si, à existência de prova simples e evidentes, que aliviem as exigências probatórias da acusação e, muito menos, da defesa, que terá, mais das vezes, maior dificuldade em infir- mar a faculdade que lhe é imputada e carecerá de acrescidas instâncias e diligências. De todo o modo, ainda que a questão da culpabilidade se apresente como relativamente pacífica, sempre a questão da determinação da sanção – que poderá ser superior a cinco anos de prisão – carece de uma exigente análise e de um juízo crítico dificilmente compaginável com a solidão do titular do processo sumário. Portanto, com tal alteração do figurino do processo sumário, pretendeu-se tornar a justiça penal mais célere e eficaz também para crimes com pena máxima abstratamente aplicável superior a cinco anos de prisão, mas com desproteção dos cidadãos, na medida em que estas situações não se compreendem, fora da norma em questão, na competência punitiva do juiz singular, mas apenas do tribunal coletivo ou de júri. Assim, deve considerar-se inconstitucional o artigo 381.º, n.º 1, do CPP na referida redação na interpretação em que é aplicável a crime cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação dos princípios das garantias de defesa e de um processo equitativo previsto nos artigos 20.º, n.º 4, e 32.º, n.º 1, da CRP, e recusar a sua aplicação ao caso vertente, com o consequente envio de processo para a forma de processo comum para julgamento por Tribunal Coletivo. Pelo exposto, o tribunal decide: – Considerar inconstitucional o artigo 381.º, n.º 1, do CPP na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação em que é aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação dos princípios das garantias de defesa e de um processo equitativo previsto nos artigos 20.º, n.º 4, e 32.º, n.º 1, da CRP, e recusar a sua aplicação ao caso vertente. – Remeter o processo para a forma de processo comum para julgamento por Tribunal Coletivo. Tendo prosseguido o processo para apreciação de mérito, o Exm.º Procurador-geral Adjunto apresentou alega- ções em que, em síntese, sustenta: 68. A solução eleita pelo legislador, e plasmada no n.º 1 do artigo 381.º do Código de Processo Penal, faz depender a atribuição da competência para o julgamento, no que concerne a crimes cuja pena máxima abstrata- mente aplicável seja superior a cinco anos, do facto incidental, e estranho ao objeto material do conhecimento do tribunal, da ocorrência de detenção em flagrante delito. 69. Ora, este facto, estranho à substância do litígio, acaba por determinar, que, de forma desigual e iníqua, factos da mesma natureza e gravidade, sejam julgados, distintamente, por um tribunal singular ou por um tribunal coletivo, conforme, respetivamente, o arguido tenha, ou não, sido detido em flagrante delito.
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