TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

525 acórdão n.º 418/13 Refere o tribunal a quo que tal interpretação, além de permitida pela redação do referido artigo 4.º, n.º 1, é confirmada pelo teor do artigo 156.º do Código da Estrada. A argumentação utilizada, no sentido de fundamentar o juízo de inconstitucionalidade, é do seguinte teor: «(…) Qualquer restrição a direitos fundamentais constante em legislação ordinária deve respeitar o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.°, n.º 2, da CRP, nos termos do qual a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao neces- sário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Em causa [está a] apreciação da constitucionalidade de uma recolha de prova para procedimento criminal ou contraordenacional, mediante ofensa à integridade física do arguido. Objetar-se-á que a recolha de sangue necessária ao exame de pesquisa de álcool, que implica uma punção venosa, concretiza uma ofensa à integridade física pouco significativa. Não deixa de se reconhecer ser verdade, mas não é menos verdade que resulta de regras de experiência comum ser esta punção venosa bastante penosa para muitas pessoas sem apelo a sensibilidades especialmente embotadas ou desfasadas. De qualquer forma, seja qual for a enfatização da parca significância da agressão, julgamos que nenhum jurista hesitaria em considerar ofensa à integridade física, enquadrável no artigo 143.°, do CP, uma punção venosa não consentida em outra pessoa. Estamos por isso perante uma limitação legal ao direito à integridade física. Vejamos então qual o direito ou interesse constitucionalmente protegido que justifica esta limitação. Será, numa resposta imediata, a segurança rodoviária, e mediatamente a vida e integridade física de terceiros. Não é no entanto exato. A disposição em questão não se destina a impedir um condutor embriagado de conduzir, mas sim a obter provas necessárias ao seu sancionamento por um crime ou uma contraordenação já consumados, precisamente por conduzir embriagado. O impedimento imediato de conduzir a um condutor embriagado prescinde completamente do exame ao sangue em questão, como de resto resulta claro do artigo 154.º, n.º 1, do CE. Tratando-se de obtenção de provas para procedimento criminal ou por contraordenação cumpre chamar a aplicação do artigo 32.º, n.º 8, da CRP, nos termos do qual são nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa à integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na cor- respondência, ou nas telecomunicações. Esta disposição constitucional consagra uma proibição absoluta de métodos de obtenção de prova em processo criminal que impliquem ofensa à integridade física da pessoa. É portanto a própria constituição que estabelece os limites de colisão entre estes dois interesses constitucionalmente protegidos, com prevalência absoluta da integri- dade física. Não se aceita assim a douta argumentação exarada no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25 de março de 2010, proc. n.º 1828/06.3TALRA.C1, in www.dgsi.pt ., no sentido que a compressão ao direito à inte- gridade física necessária à realização do exame é suscetível de ser enquadrada no princípio da concordância prática entre valores constitucionais, nos termos prescritos no artigo 18.°, n.º 2, da CRP. Repete-se que não há concor- dância prática entre o interesse na perseguição criminal e o direito fundamental à integridade física. Nos termos do artigo 32.º, n.º 8, da CRP, a prevalência do segundo é absoluta.» É desta sentença que o Ministério Público interpõe o presente recurso, apresentando alegações, onde conclui, nos termos seguintes: «1. Com a realização de testes de alcoolemia – aí se incluindo o efetuado por análise ao sangue – está em causa a recolha de um meio de prova altamente perecível no âmbito da prevenção e punição de condutas suscetíveis de por em perigo o valor segurança rodoviária, que encerra em si mesmo outros bens jurídicos de elevada relevância e dignidade como o direito à integridade física, à vida ou à propriedade privada de terceiros.

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