TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

520 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ‘É evidente – lê-se no citado Acórdão n.º 634/83 – que o juízo sobre a necessidade do recurso aos meios penais cabe, em primeira linha, ao legislador, ao qual se há de reconhecer, também nesta matéria, um largo âmbito de discricionariedade. A limitação da liberdade de conformação legislativa, nestes casos, só pode, pois, ocorrer quando a punição criminal se apresente como manifestamente excessiva’.» Não se crê que a norma em sindicância coenvolva uma situação reconduzível, pela sua excessividade, à violação do princípio da proporcionalidade e ao desrespeito do artigo 18.º da CRP, ou, tão pouco, que importe “danosidade social” a exigência de utilização vinculada dos meios financeiros concedidos exclusivamente para a execução de programas nessa medida e enquanto tais a eles concretamente afetados. Pois bem, sublinhou-se na decisão ora recorrida a passagem do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 28/84 onde a tipificação das condutas que passaram a ser tuteladas criminalmente se justifica pela necessidade de proteger o interesse público que a “correta aplicação dos dinheiros públicos” encerra, nesse tipo de atuação. E, na verdade, verificada a insuficiência da lei civil para controlar os interesses em jogo, surgiu, naturalmente, a necessidade de tipificar legalmente, no plano da criminalidade económica, as condutas eticamente censuráveis, dando-se, assim, combate às violações mais graves dos respetivos bens jurídicos que integram o direito penal eco- nómico, como se escreve, a certo passo, no Acórdão n.º 1142/96, citado, a propósito das chamadas “irregularida- des” nos subsídios do Fundo Social Europeu, um trabalho de Pedro Verdelho, publicado na Revista do Ministério Público, n.º 66, pp. 61 e segs. (“As chamadas ‘irregularidades’ nos subsídios do Fundo Social Europeu são crime ou apenas constituem ilícito civil?”). Ora, não contendo o texto constitucional uma qualquer proibição de criminalização e conhecendo a necessi- dade experimentada em Estado de direito de proteger penalmente os bens e interesse jurídicos essenciais ao viver em comunidade, a liberdade de conformação do legislador ordinário só conhecerá limitação, nesta perspetiva, se se representar como manifestamente excessiva a punição criminal encontrada. O que significa que a existência de instrumentos legais disciplinadores da matéria de concessão de subsídios concedidos pelo Fundo Social Europeu, sancionando civil ou administrativamente as referidas “irregularidades” – globalmente consideradas – , não significa, nem exclui, que certos desses “desvios” tenham merecido do legislador ordinário uma sanção mais severa, do foro criminal, uma vez tipicizados os respetivos comportamentos. O facto de o direito comunitário prever sanção diferente para a prática de irregularidades na utilização das con- tribuições do FSE – suspensão, redução ou supressão, quando ainda não estejam pagas, a sua repetição, nos casos em que já tenha havido pagamento – pode significar que o legislador nacional não qualifique como penalmente ilícitas as correspondentes condutas exigidas ou autorizadas por aquele direito, mas não exclui, em princípio, que os Estados membros punam atuações que tenham por ilícitas, o que é substancialmente distinto, como, aliás, se fez notar no Acórdão n.º 440/97, inédito. 3.4. – Por outro lado, com a interpretação dada à norma tão pouco se desenha violação do princípio non bis in idem, cuja contrariedade depende da identidade do bem jurídico tutelado por normas sancionadoras concorrentes, ou do desvalor pressuposto por cada uma delas, como se observou recentemente no Acórdão n.º 244/99, publicado no Diário da República , II Série, de 12 de julho último. Com efeito, não se vê que à prática da infração em causa corresponda uma plúrima aplicação de sanções jurídico-penais, sendo certo que os lugares legislativos convocados pelo recorrente, nas suas alegações, se situam em planos diferenciados (assim, v. g. , o caso Decreto-Lei n.º 132/83, de 18 de março, ao regular o regime de incentivos fiscais e financeiros ao investimento, revogando o regime esta- belecido pelo Decreto-Lei n.º 194/80, de 19 de junho; do Decreto-Lei n.º 75-A/91, de 15 de fevereiro, ao aprovar o sistema de incentivos à modernização do comércio; do Decreto-Lei n.º 289/92, de 26 de dezembro, ao prever a resolução dos contratos, nomeadamente por não cumprimento dos objetivos e obrigações aí estabelecidos ou pelo não cumprimento atempado das obrigações fiscais por parte da empresa promotora ou, ainda, pela prestação de informações falsas sobre a situação da empresa ou viciação de dados fornecidos na apresentação e apreciação e no acompanhamento dos projetos; do Decreto-Lei n.º 246/93, de 8 de junho, situado na mesma área e de outros, que nada têm a ver com o bem jurídico tutelado especificamente pela norma do questionado artigo 37.º)».

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