TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
480 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL como prova pericial, na valoração dos mesmos e, bem assim, dos depoimentos dos seus autores (também eles desconsiderados como peritos), assumiu-os como se verdadeiros juízos técnico-científicos se tratassem. c) A realização de uma perícia, tendo em conta o estatuto conferido ao perito, sujeito a compromisso de honra, com a possibilidade de escusa e recusa (153.º n.º 2 do CPP), aliado à qualificação técnico-científica que lhe é exigida (art.º 152.º n.º 1 do CPP), permite garantir a possibilidade de ser obtido um juízo técnico rigoroso, alcançado de forma equidistante da Defesa e da Acusação. d) O Tribunal de 1.ª instância ignorou, pura e simplesmente, a circunstância de inexistir nos autos qualquer prova técnica e cientifica comprovativa da adição de álcool ao vinho exportado por parte dos Arguidos. E de esse constituir o único meio possível e admissível de prova dessa mesma adição, isto é, da alegada falsi- ficação do vinho. e) O juízo do Tribunal de 1.ª Instância, numa questão exclusivamente técnico-científica, fundou-se, pois, em critérios próprios da livre apreciação da prova (testemunhal e documental) e não, como se impunha, considerando a especificidade do valor probatório da perícia. f ) Ora, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29 de junho de 2011, reiterado pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 30 de maio de 2012, ao julgar improcedente a argumentação dos Arguidos no que concerne a esta magna questão, atentou, também ele, de forma direta, contra o princípio do contraditório e da igualdade de armas entre a Defesa e a Acusação. g) As normas dos artigos 151.º, 152.º, n.º 1, e 153.º, n.º 2, do CPP, na aplicação/interpretação implícita que delas faz o Tribunal da Relação de Coimbra, violam ostensivamente as garantias de defesa e o direito a um processo equitativo, bem como o princípio in dubio pro reo, consagrados nos artigos 2.º e 32.º, n. os 1, 2 e 5, 2.ª parte, da CRP. h) A interpretação desenvolvida pelo Tribunal da Relação de Coimbra, a fls. 239 a 263 do Acórdão de 29 de junho, resulta num segmento normativo segundo o qual “a realização de perícia em desconformidade com os artigos 151.º, 152.º, n.º 1, e 153.º, n.º 2, do CPP permite, sob ponto de vista formal, a consideração pelo tribunal dos respetivos relatórios periciais juntos aos autos como prova documental e dos depoimentos dos seus autores como testemunhas, atribuindo, todavia, a um e a outro meio de prova um caráter técnico- -científico que só a prova pericial permite”. i) O que é tanto mais decisivo e grave quando a dita prova documental e testemunhal não procede de peritos ou expertos independentes, mas consubstancia o próprio acervo probatório empregado pela acusação para carregar os arguidos a juízo, o que, em última análise, agrilhoa e fere a própria ideia de processo e julga- mento e firma a de uma dupla acusação. j) Os Arguidos suscitaram a questão da inconstitucionalidade aduzida, designadamente, a páginas 8, 54, 61, 62, 78 a 84, 152, 153, 165, t69, 178, 186, 195 a 210, 230, 234, 279 a 280 e 300 das alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, nas conclusões II, XIII, XV, XLV, XLVI, XLVII, LVII, LVIII, LIX, LXXI, LXXIII, LXXIV, LXXV, LXXVIII, LXXIX, LXXX, LXXXII, XCVII, XCVIII, XCX, CVII, CXXVIII e ainda no requerimento em que arguiram a nulidade do Acórdão de 29 de junho de 2011 (pontos 61 a 63). 3) Da inconstitucionalidade do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29 de junho de 2011 e do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 30 de maio de 2012, por omissão do dever de reenvio. a) Os pressupostos do crime em que os Arguidos foram condenados – fraude na obtenção de subsídio con- sistente na atribuição de restituições à exportação de vinho de mesa para fora da Comunidade – são con- cretamente definidos pela regulamentação comunitária, nomeadamente pelos Regulamento n. os 351/79, 822/87 e 3665/87. b) Ou seja, embora o tipo legal de crime esteja previsto no artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro, a verificação dos requisitos materiais e formais de que dependia a atribuição, ou não, da ajuda à restituição está inteiramente dependente do direito comunitário.
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