TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
477 acórdão n.º 406/13 de legitimidade do arguido em processo penal para recorrer, feita pelo Tribunal da Relação de Coimbra a fls. 32 a 34 do acórdão prolatado, que redunda num segmento normativo segundo o qual: “O arguido não tem legitimi- dade para recorrer do despacho que indefere a realização de prova pericial se o tribunal, no respetivo despacho de indeferimento, equacionar a eventualidade de, ainda no decurso da audiência de julgamento, poder reponderar parcialmente a sua decisão, mesmo que o tribunal não tenha efetuado tal reponderação e de ter até admitido, logo e sem mais, o dito recurso.” 15. Tal interpretação ofende violentamente a Constituição da República Portuguesa, designadamente, o artigo 32.º, n.º 1, que assegura aos arguidos todas as garantias de defesa, em especial o recurso. 16. Porque esta interpretação da norma de legitimidade é totalmente inovadora e surpreendente, nunca a ora Requerente invocou, em momento anterior ao da interposição do presente recurso, a inconstitucionalidade do artigo 401.º, n.º 1, alínea b) , do CPP. 17. Só não o fez, porque, razoável e diligentemente, não podia nunca ter antecipado que o Tribunal da Relação de Coimbra viesse a perfilhar uma interpretação logicamente viciada e totalmente contrária ao espírito e à letra das garantias constitucionais de processo criminal. 18. Na verdade, jamais, em caso e tempo algum, poderia a Requerente contar com uma leitura da norma de legitimidade que excluísse do direito ao recurso arguidos que viram formal e expressamente indeferido um reque- rimento de produção de prova. Tanto mais que o tribunal a quo afirma apertis brevis que indefere a pretensão de realização da prova pericial requerida e, em coerência, de imediato admitiu sem quaisquer peias ou reservas o requerimento de recurso. 19. Importa insistir que uma tal interpretação, por tão contrária ao mais elementar senso jurídico, é tudo menos expectável, trata-se de uma verdadeira decisão-surpresa. 20. Nenhum jurista, nem os que gozam de dons divinatórios, poderia contar com uma aplicação da norma de legitimidade feita em termos tão restritivos e, ainda por cima, estribada numa fundamentação explícita e clara. 21. Daí que se deva tomar esta decisão da Relação de Coimbra como uma verdadeira e própria decisão-sur- presa, ao forjar uma novel e inédita corrente interpretativa para o artigo 401.º, n.º 1, alínea b) . III – Elementos próprios da fiscalização da inconstitucionalidade da norma do artigo 151.º do CPP. 22. Soma-se à interpretação de normal legal profanadora da Lei Fundamental anteriormente referida a inter- pretação implícita – mas patente – no Acórdão da Relação de Coimbra acerca das normas respeitantes à prova pericial, a saber, e em concreto, do artigo 151.º do CPP. 23. Na verdade, o Tribunal da Relação de Coimbra, ao rejeitar o recurso interposto pela Requerente, confirmou a decisão do 2.º Juízo Criminal de Viseu que indeferiu a prova pericial requerida, em alegado detrimento da prova documental e testemunhal. Ou seja, o Tribunal da Relação de Coimbra sufragou a interpretação inconstitucional do artigo 151.º do CPP levada a cabo pelo 2.º Juízo Criminal de Viseu nos termos seguintes: “Na contestação pretende-se, ainda, a realização de perícia colegial. Ora, no que tange à perícia requerida e aos quesitos formulados somos do entendimento que tais questões podem ser esclarecidas quer com a prova documental junta aos autos, quer com os peritos já indicados em audiência de julgamento ou com as testemunhas e técnicos indicados quer pela acusação quer pela defesa. (…)” 24. Tal interpretação vulnera a Constituição da República Portuguesa, designadamente, o artigo 32.º, n.º 1, n.º 3 e n.º 5 da 2.ª parte do número 5 da CRP, que, em nome da radical desigualdade material de partida entre a acusação e a defesa, assegura aos arguidos todos os direitos e instrumentos necessários e adequados à salvaguarda da sua posição, em especial, o direito à organização da defesa e o princípio do contraditório. 25. Tais garantias de defesa e igualdade de armas e, em particular, o direito à organização da defesa e o princípio do contraditório, todos de bitola constitucional, constituem, assim, o padrão de controlo daquela interpretação
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