TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
459 acórdão n.º 404/13 42.º Se nos centrarmos no parágrafo 2 do artigo 47.º da CDFUE, constatamos que não existe qualquer referência a um tipo específico de causa a que o direito a um “processo equitativo” se aplique. 43.º Isto é, o princípio em causa, na conformação que lhe é dada pelo segundo parágrafo do artigo 47.º da CDFUE, aplica-se mesmo àquelas poucas causas que escapam ao âmbito de proteção do artigo 6.º, n.º 1 da CEDH [3] , sendo este, pois, um daqueles casos em que o direito da União confere uma proteção acrescida em relação à CEDH, tal como admitido no artigo 52.º, n.º 3 da CDFUE. 44.º Facilmente se conclui, pelo exposto, que independentemente de se saber se os processos de contraordenação estão abrangidos pelo artigo 6.º, n.º 1 da CEDH, sempre ficariam cobertos pelo artigo segundo parágrafo do 47.º da CDFUE. 45.º Não obstante, iremos demonstrar que os processos de contraordenação – como aquele que está em causa nos presentes autos – constituem matéria penal, para efeitos da CEDH, pelo que devem respeitar, igualmente, o direito fundamental a um processo equitativo. 46.º As expressões “direitos e obrigações de caráter civil” e “acusação em matéria penal” constituem conceitos pró- prios da CEDH, desenvolvidos pela jurisprudência do TEDH, não tendo necessariamente de corresponder aos mesmos termos usados nos diversos ordenamentos nacionais. 47.º Assim, relativamente aos “direitos e obrigações de caráter civil” o que é relevante é o caráter do direito ou da obrigação em si mesma e não o caráter da legislação que a governa (civil, comercial, administrativa, etc). [4] 48.º Quanto à natureza penal da acusação – como bem referiu o Tribunal a quo, citando o acórdão Öztürk v. Alema- nha – esta categoria inclui decisões em processos de contraordenação, como aqueles que estão em causa nestes autos. 49.º Tal conclusão resulta da aplicação ao caso concreto dos comumente designados “critérios Engel” (isto é, dos critérios de aplicação não cumulativa definidos pelo TEDH no acórdão Engel v. Holanda (1976) para qualificar como penal uma determinada acusação e que têm sido reiteradamente aplicados desde então). 50.º Segundo a jurisprudência do TEDH, o elemento que serve de ponto de partida à análise do Tribunal é a própria classificação da acusação em direito interno: caso o direito interno qualifique a acusação como “penal”, o TEDH aceitará essa qualificação [5] ; se assim não for, o TEDH analisará os dois critérios mais importantes (também eles, não cumulativos): (i) o da natureza da infração e (ii) o da natureza e severidade da punição [6] . [3] Como, por exemplo, os processos de deportação (acórdão Mamatkulov e Askarov v. Turquia (2005)). [4] Neste sentido, veja-se o acórdão do TEDH Ringeisen v. Áustria (1971), parágrafo 94: The character of the legislation which governs how the matter is to be determined (civil, commercial, administrative law, etc) and that of the authority which is invested with jurisdiction in the matter (ordinary court, administrative body, etc) are therefore of little consequence. [5] Acórdão Engel v. Alemanha (1976), parágrafo 81. [6] Por exemplo, no acórdão Lauko v. Eslováquia (2001), o TEDH considerou como tendo uma natureza penal infrações consideradas como “administrativas” pelo direito nacional.
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