TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

45 acórdão n.º 296/13 operar a delegação intersubjetiva a que respeita, os requisitos de determinação de conteúdo e de identificação dos sujeitos da delegação que, em função das razões que constitucionalmente a justi- ficam, se impõem ao legislador preservar. Com efeito, o instrumento da delegação é um contrato interadministrativo (cfr. artigo 338.º do Código dos Contratos Públicos), cujas linhas gerais constam dos artigos 103.º a 109.º do diploma que, aliás, o Acórdão destaca. Desde logo, o caracter bilateral e as exigências a que a celebração, execução e cessação do contrato delegatório obedece são idóneos a preservar as condições jurídicas e materiais da autonomia dos entes que recebem a delegação, pelo que esta vertente da função da reserva de lei não está em risco. Os intervenientes intervêm, num plano de igualdade jurídica e numa perspetiva de harmonização do desempenho das atribuições dos entes respetivos. A questão da insuficiente determinação de conteúdo da norma habilitante só poderia ser problemática na vertente do risco de “autoexoneração” das tarefas legalmente cometidas ao delegante que a relativa indeterminação resultante do uso de cláusulas gerais poderia potenciar. Para tanto, porém, no juízo sobre os requisitos constitucionalmente exigidos à norma habilitante, não pode abstrair-se do concreto domínio material e de organização administrativa em que a dele- gação se destina a operar. Na hipótese, estamos num quadro de cooperação interadministrativa, destinada a tornar mais eficiente e eficaz a atuação da Administração Pública, permitindo uma individualização apropriada às situações de “interesses próprios das populações” da autarquia res- petiva que o enunciado legal dificilmente pode elencar de modo exaustivo perante o concurso de atribuições de pessoas coletivas de fins múltiplos. Para cumprir a exigência de delimitação do âmbito material de delegação competências do Estado ( rectius, de órgãos do Estado) nas autarquias, a lei estabelece um limite negativo (a intangibilidade das atribuições estaduais), um limite positivo (todos os domínios dos interesses próprios das populações das autarquias locais, em especial no âmbito das funções económicas e sociais) e uma vinculação teleológica (a promoção da coesão territorial, o reforço da solidariedade inter-regional, a melhoria da qualidade dos serviços prestados às populações e a racionalização dos recursos disponíveis). Trata-se do desempenho de tarefas e do exercício de poderes administrativos conferidos por lei, em zonas de confluência de atribuições do poder central e do poder local. Na substância das coisas, a técnica legislativa utilizada não oferece menor préstimo para o controlo do exercício do poder correspondente (por parte da Administra- ção, dos particulares e dos tribunais) do que as alternativas razoavelmente concebíveis, que dificil- mente poderiam ir além de uma lista genérica de domínios de atribuições em que a competência (os poderes legalmente conferidos aos órgãos do Estado) é delegável (cfr. v. g. artigo 13.º do Decreto- -Lei n.º 159/99, de 14 de setembro). Por outro lado, o regime em apreço também não merece a censura que o Acórdão lhe faz por inde- terminação dos órgãos do Estado com competência para delegar. A delegação surge no diploma em causa como uma forma de articulação de atribuições (artigo 100.º, n.º 1), no âmbito da função administrativa do Estado. Abstratamente, podem delegar poderes todos os órgãos do Estado no âmbito da sua função administrativa, desde que observado o regime competencial para se obri- gar em contrato interadministrativo e os referidos limites materiais. Mas os poderes delegados só podem ser aqueles que, no âmbito das atribuições do Estado com incidência nos interesses próprios das populações da autarquia, surjam no elenco de competências que a lei (diploma orgânico, atri- buição legal avulsa ou especial) comete a cada órgão do Estado. Assim, a titularidade da competên- cia dispositiva primária no âmbito suscetível de delegação considerado torna determinável o âmbito subjetivo (ativo) da delegação, sem necessidade de individualização na norma habilitante. B) De todo o modo, a norma da alínea k) do n.º 1 do artigo 25.º do Decreto teria de ser retirada do elenco das normas que o acórdão considera violadoras do n.º 2 do artigo 111.º da Constituição. Essa norma limita-se à repartição interna de competência, diz que órgão tem poder de autorizar (e implicitamente de celebrar) os contratos de delegação de competências. É, em si mesmo, de conteúdo

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=