TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
420 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL garantístico, expandindo-o para outros domínios decisórios quando se demonstre, na dinâmica do processo, que só pela garantia do recurso se efetiva o direito de defesa. Assim sendo, integrar-se-á também no âmbito nuclear de tutela constitucional do direito ao recurso, em tal perspetiva substantiva, a garantia de que se poderá recorrer perante um diferente e hierarquicamente superior órgão jurisdicional, não apenas da decisão final condenatória, mas também de todos os «atos judiciais que, durante o pro- cesso, tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido» (Acórdão n.º 31/87 e, reiterando-o, Acórdãos n. os 259/88, 265/94 e 610/96, entre outros). Como estará dela excluída, por desnecessariamente compressora de outros direitos fundamentais cuja efetiva proteção implica uma eficaz repressão do crime, a pretensão de sindicar perante um tribunal superior «todo e qualquer ato do juiz», não podendo, pois, entender-se que «o legislador (esteja) constitucionalmente adstrito a con- sagrar a garantia de recurso constitucional quanto a todos os despachos proferidos em processo penal» (Acórdãos n. os 31/87, 118/90, 332/91, 189/92 e 265/94). A essa luz conciliatória, «se há de admitir que essa faculdade de recorrer seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que, relativamente a certos atos do juiz, possa mesmo não existir, desde que, dessa forma, «se não atinja o conteúdo essencial dessa mesma faculdade, ou seja, o direito de defesa do arguido» (citado Acórdão n.º 31/87). O Tribunal Constitucional, em concretização de tais premissas, de ordem axiológica e conceitual, não tem, assim, censurado, na perspetiva da sua conformação constitucional, variadíssimas soluções normativas, inclusive de índole interpretativa, que, relativamente a determinados atos judiciais situados afora daquele nuclear períme- tro decisório, vedam ao arguido o direito ao recurso: irrecorribilidade do despacho do juiz que designa dia para julgamento em processo correcional (Acórdãos n. os 31/87 e 118/90); irrecorribilidade do despacho que recebe a acusação por crime de emissão de cheque sem provisão (Acórdão n.º 259/88); irrecorribilidade do despacho de pronúncia (Acórdãos n. os 353/91, 265/94, 610/96, 468/97, 30/01), irrecorribilidade do despacho de pronúncia, na parte em que decide de questões prévias ou incidentais (Acórdãos n. os 216/99 e 387/99); irrecorribilidade do despacho do juiz que indefere requerimento de realização de diligências instrutórias (Acórdãos n. os 371/00 e 375/00); irrecorribilidade do despacho que nega a liberdade condicional (Acórdão n.º 321/93); irrecorribilidade do despacho que declara a incompetência em razão do território (Acórdão n.º 158/03); irrecorribilidade dos acór- dãos das Relações proferidos em incidente de recusa de juiz (Acórdão n.º 565/07). Mas, em aplicação do mesmo critério de apreciação, o Tribunal não deixou de julgar inconstitucional a inter- pretação que, fundada na norma legal ora em apreço, na redação anterior à entrada em vigor da Reforma de 2007, considerou ser irrecorrível decisão do Tribunal da Relação que se pronuncie pela primeira vez sobre a especial complexidade do processo, pois que aqui, ao contrário do que se entendeu ocorrer nos recursos decididos pelos citados arestos, o direito de defesa do arguido, face à intensidade lesiva de uma tal decisão inovatória, que implicava a ampliação dos prazos de duração máxima da prisão preventiva, impunha, como condição da sua efetivação no processo, a possibilidade de contra ela reagir através de um grau de recurso (Acórdão n.º 686/04). Do mesmo modo, apreciando interpretação normativa do mesmo artigo 400.º, n.º 1, alínea c) , do CPP, na sua anterior redação, que distinguia, para efeitos de admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, as decisões das Relações que, por razões de natureza adjetiva, punham termo ao processo daquelas que operavam tal efeito mas pela apreciação do mérito do recurso, considerando apenas estas últimas sindicáveis, considerou o Tribunal Constitucional tratar-se de uma «distinção arbitrária ou injustificada quanto ao exercício do direito ao recurso que o n.º 1 do artigo 32.º abre ao arguido», pois que, «pondo a decisão questionada (…) realmente termo ao processo, é arbitrário ou injustificado, na perspetiva das garantias de defesa do arguido, distinguir entre pôr termo à causa por razões de direito penal substantivo e pôr termo à causa por razões de direito processual penal», para o efeito de sujeitar esta última categoria de decisões ao regime de insindicabilidade consagrado na citada norma legal (Acórdão n.º 597/00). Os citados exemplos jurisprudenciais demonstram, pese embora a diversidade normativa dos recursos neles apreciados e o diferente sentido do juízo final de constitucionalidade neles formulado, que a razão da conformi- dade ou desconformidade constitucional das opções normativas então em apreciação, embora emergente da análise do conteúdo decisório do ato judicial de que se pretendia recorrer, assentava fundamentalmente na onerosidade
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