TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

419 acórdão n.º 400/13 segundo a reforma da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto”, em Revista da Universidade Portucalense, n.º 13, 2008; e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Editorial Verbo, 2009, p. 318). Não admitem, pois, recurso, no atual quadro legal de definição, positiva e negativa, das competências do Supremo Tribunal de Justiça, os acórdãos das Relações que não julgam o mérito da causa [cfr. artigos 97.º, n.º 1, alínea a) , e 419.º, n.º 3, alínea b) , do CPP], sendo que foi com esse fundamento que a decisão recorrida considerou ser, no caso, irrecorrível o acórdão da Relação de Coimbra que julgou intempestivo o recurso antes admitido pela 1.ª instância. A questão essencial que importa, assim, apreciar, à luz do parâmetro de constitucionalidade enunciado pelo recorrente (artigo 32.º, n.º 1, da CRP), é a de saber se o direito ao recurso, na sua expressão garantística máxima, confere ao arguido o direito de ver reapreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça, não a decisão que o condena, no caso na pena de 17 anos de prisão, mas aquela que não admite, por intempestivo, o recurso dela interposto, fazendo, desse modo, operar o trânsito em julgado da decisão condenatória proferida em primeira instância. O instituto recursório, no âmbito do sensível domínio normativo em que nos movemos, encerra, como todos os demais institutos que nele se enquadram, uma tensão dialética permanente e nunca integralmente harmonizável entre duas finalidades antinómicas do direito processual penal: por um lado, a realização da justiça penal e, com ela, a efetivação do poder punitivo do Estado; por outro, a garantia de que tal desiderato não é alcançado com o sacrifício dos direitos fundamentais da pessoa humana, desde logo, do arguido, a quem a Lei Fundamental expres- samente reconhece, no seu artigo 32.º, um direito fundamental de defesa (sublinhado, em geral, tal traço antinó- mico do direito processual penal, cfr. Figueiredo Dias, Código de Processo Penal. Processo Legislativo, Assembleia da República, 1999, fls. 31-30). É, pois, na tentativa constitucionalmente imposta de realizar a concordância prática dos valores, de sinal inverso, que estruturam o processo penal, que o Tribunal Constitucional tem, na vasta jurisprudência sobre o tema, solucionado as diversas questões de inconstitucionalidade normativa suscitadas por alegada violação do direito fundamental ao recurso, parametrizando nuclearmente a sua apreciação à luz da injunção constitucional de que o arguido seja “julgado no mais curto prazo”, o que só se alcança com um processo célere e eficaz, “compatível com as garantias da defesa” (entre elas, o direito ao recurso), que se prefiguram, assim, como limite imanente, aferido em concreto, de realização do processo penal (artigo 32.º, n.º 2, da CRP). Os recursos são “meios de obter a reforma da sentença injusta, da sentença inquinada de vício substancial ou de erro de julgamento” (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Reimpressão, Coimbra, 1984, p. 212), pretendendo-se, através deles, um novo exame da causa, por parte do órgão jurisdicional hierarquicamente superior. Tal definição, embora construída no contexto processual civil, tem o mérito de sublinhar que o recurso é, antes de mais, um meio de reação contra a decisão de mérito que, no termo final do processo destinado a realizar a justiça do caso, resolve o litígio, condena ou absolve o arguido; por outro lado, traduzindo o recurso, em análise estrutural, «uma nova apreciação judicial de matéria já julgada» por instância jurisdicional superior (Manuel Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, volume 2.º, Lisboa, 1986, p. 280), o que a expressa consagração constitucional do direito do arguido ao recurso quer significar e garantir é, nuclearmente o direito de ver reapreciada, pelo menos num grau de recurso, a sentença final condenatória contra si proferida (princípio do duplo grau de jurisdição). Assim, situando o recurso nessa sua área nuclear de justificação e operacionalidade – enquanto meio primacial- mente dirigido à correção de erros ou vícios das decisões de mérito ou de fundo –, sublinhou o Tribunal Consti- tucional, no seu Acórdão n.º 118/90, constituir “a faculdade de recorrer da condenação (…) peça dominante do quadro dialético em que se desenvolve o processo penal: é ela que permite ao arguido superar a antítese entre o interesse público à condenação e o seu próprio interesse de defesa e obter a reforma da sentença injusta, de sentença inquinada de vício substancial ou de erro de julgamento”, pelo que “a faculdade de recorrer da sentença condena- tória proferida em primeiro julgamento, qualquer que seja a dimensão dada ao recurso, há de inserir-se naquele complexo de garantias que caracterizam o direito de defesa”. Reconhecendo-se, porém, que o recurso é, no seu contexto constitucional, um instrumento de garantia do direito de defesa do arguido, é este último que deve substantivamente nortear a maior ou menor latitude do meio

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