TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
371 acórdão n.º 355/13 aceder ao ensino superior. As normas em crise são, na verdade, meramente declarativas da convicção – aliás, de conhecimento geral – de que o ensino recorrente estava a ser instrumentalizado para finalidades contrárias à sua “matriz enformadora”, e de que a prolongada inércia legislativa na correção desta matéria urgia ser invertida. Admitir, atento este quadro, que expectativas legítimas e fundadas em boas razões possam ter medrado nos alunos em causa é no mínimo questionável. De facto, talqualmente se alertou supra, a legitimidade das expectativas dos cidadãos não está dependente do apuramento de uma mera convicção psicológica destes na estabilidade de um dado regime jurídico, antes carece de ser escrutinada à luz de um filtro objetivo, que teste a repercussão que a conduta estadual possa razoavelmente ter produzido nos cidadãos afetados, e à luz de um filtro normativo, o qual, mais do a que licitude das expectativas, deve determinar a validade-legitimidade (as “boas razões”) destas tendo em conta os princípios jurídico-constitucionais vigentes. Posto isto, se o período de tempo transcorrido desde a última alteração legislativa ao regime jurídico do ensino recorrente pode ter dado alguma consistência às expectativas dos indivíduos abrangidos, certo é que a legitimidade destas surge inelutavelmente afetada, não só porque a reação estadual se afigurava objetivamente expectável, como por- que tais expectativas não se acham fundadas em boas razões, isto é, em razões compatíveis com a teleologia normativa do ordenamento jurídico-constitucional. Esta conclusão, sublinhe-se, não briga com a decisão adotada por este Tribunal na jurisprudência cons- tante dos Acórdãos n. os 176/12, 275/12 e 277/12 (todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) . Aí, com efeito, o Tribunal, instado a apreciar a validade das alterações produzidas no regime especial de acesso ao ensino superior de que são beneficiários os atletas de alta competição (cfr. artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 393-A/99, de 2 de outubro, na redação dada pelo artigo 46.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 272/2009, de 1 de outubro) concluiu pela legitimidade das expectativas daqueles, mas apenas em virtude de tal alteração legislativa tomar em consideração factos já parcialmente realizados (classificações obtidas em provas realiza- das antes da entrada em vigor das referidas normas), o que não sucede in casu . No caso vertente, o juízo quanto à prevalência do interesse público torna-se, por conseguinte, dispensá- vel, pelo que há que concluir, atento o exposto, que as normas em crise não importam qualquer violação do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima dos cidadãos. III – Decisão Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Não julgar inconstitucional, por violação do princípio da segurança jurídica e da proteção da con- fiança, dedutível do artigo 2.º da CRP, as normas dos artigos 11.º, n. os 4 e 6, e 15.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42/2012, de 22 de fevereiro, na interpretação segundo a qual as alterações normativas consagradas se aplicam, sem previsão de regime transitório, a todos os alunos matriculados no ensino secundário recorrente. b) Consequentemente, conceder provimento ao recurso, determinando a reformulação da decisão recorrida em conformidade com o presente juízo de não inconstitucionalidade. Sem custas. Lisboa, 27 de junho de 2013. – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Joaquim de Sousa Ribeiro. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 3 de dezembro de 2013. 2 – Os Acórdãos n. os 287/90 e 303/90 estão publicados em Acórdãos, 17.º Vol.. 3 – Os Acórdãos n. os 556/03 , 399/10 e 176/12 estão publicados em Acórdãos, 57.º, 79.º e 83.º Vols., respetivamente.
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