TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
358 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que tal situação não constitui violação do caso julgado, uma vez que a pena de substituição não transita em julgado, pois não fica definitivamente garantida por estar sujeita à condição resolutiva do decurso do prazo sem se registar a prática pelo condenado de novos crimes (e eventualmente pelo cumprimento de deveres e condições, por parte deste). Ou seja, segundo o entendimento da decisão recorrida, o caso julgado abrange apenas a medida concreta da pena de prisão (principal), mas não a forma da sua execução, ou seja, a sua substituição por pena suspensa. Daí que, entendendo-se, como faz a decisão recorrida, que a suspensão da pena de prisão, tem um cará- ter de provisoriedade, no caso de conhecimento superveniente do concurso, tal pena poderá perder autono- mia e ser englobada na pena única, sem que se mostre violado o caso julgado. Ainda segundo esse entendimento, trata-se de aplicar, sem restrições, ao caso de conhecimento super- veniente do concurso, as regras previstas no artigo 77.º do Código Penal, para as quais remete o artigo n.º 1 do artigo 78.º do aludido Código, por forma a tratar de modo igualitário as situações em que o concurso é de conhecimento simultâneo (artigo 77.º do Código Penal) e as situações de conhecimento superveniente (artigo 78.º do Código Penal), uma vez que, neste último caso, só por razões aleatórias ou fortuitas o tribunal não tomou conhecimento, em simultâneo, de todas as penas em concurso. Assim, a provisoriedade da suspensão da pena de prisão resultaria, não só da verificação das hipóteses previstas no artigo 56.º, n.º 1, do Código Penal, mas também da possibilidade de tal suspensão não ser man- tida por força do conhecimento superveniente de concurso em que fosse incluída essa pena e em que a sus- pensão da mesma não venha a ser mantida na ponderação global a efetuar para aplicação da pena conjunta. Ora, para além de, conforme se disse, o princípio da intangibilidade do caso julgado não ser absoluto, este entendimento, mantendo intocado o caso julgado no que respeita às penas (principais) aplicadas e sustentando a provisoriedade da pena de prisão suspensa, é de molde a respeitar, no essencial, essa intangibilidade. Mas, mesmo que assim não se entenda, não se poderá deixar de reconhecer que a interpretação sindicada tem subjacente um fundamento válido no plano jurídico-constitucional que é o do tratamento igualitário de situações materialmente idênticas: ou seja, pretende-se tratar de igual modo as situações de concurso, quer o conhecimento do mesmo seja simultâneo ou superveniente. Com efeito, sendo as situações de conhecimento superveniente do concurso resultantes, muitas vezes, conforme se referiu, de razões aleatórias ou fortuitas (sem as quais o tribunal teria procedido atempadamente à aplicação de pena única relativa aos crimes em situação de concurso), esta é uma razão constitucionalmente válida para que não se estenda a eficácia do caso julgado às penas de prisão suspensas, procedendo-se à deter- minação da pena única conjunta, a partir da pena de prisão substituída, como se o conhecimento do concurso tivesse ocorrido atempadamente e fosse diretamente aplicável à situação do artigo 77.º do Código Penal. Nestas circunstâncias, as razões resultantes do princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, e das exigências de certeza e segurança, de que decorre o princípio da intangibilidade do caso julgado, surgem atenuadas, quer na hipótese de se entender, como faz a decisão recorrida, que a pena de substituição, pela sua natureza, não transita em julgado, estando sujeita a uma condição resolutiva, ou ainda porque, não sendo o princípio da intangibilidade do caso julgado um valor absoluto, existe justificação material bastante para a sua restrição na circunstância de, desta forma, se pretender dar um tratamento igualitário, na perspetiva da unidade do sistema, a todos os casos de concurso, mesmo que de conhecimento superveniente. E no que respeita a uma eventual “confiança” ou “expectativa” do condenado na manutenção da suspen- são da pena de prisão, salvo nos casos de verificação do circunstancialismo do artigo 56.º, n.º 1, do Código Penal, a verdade é que tal “expectativa” não será suficientemente fundada no caso em que este tenha praticado um crime anteriormente àquela condenação, pelo qual ainda não foi julgado, pois sabe que essa suspensão pode não ser mantida, num cúmulo jurídico que venha a realizar-se futuramente, caso a pena conjunta aplicada ao cúmulo não possa legalmente ser suspensa ou se na ponderação que o tribunal que proceda ao cúmulo se entender que a suspensão, no caso, não se justifica. Já no que respeita aos princípios da proporcionalidade ou da necessidade das penas, sustenta o Minis- tério Público que a derrogação da suspensão da execução da pena, enquanto fundada em factos anteriores à
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