TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

341 acórdão n.º 340/13 uma empresa ou pelos agentes do crime, seus gerentes, a uma inspeção tributária, ao abrigo do dever de cooperação previsto nos artigos 9.º n.º 1, 28.º n.º 1 e 2, 29.º e 30.º do Decreto-Lei 413/98 de 31 de dezembro e nos artigos 31.º n.º 2 e 59.º n.º 4 da LGT, obtidos a pedido dessa inspeção, quer pessoalmente, quer através de recolha desses documentos nas suas instalações, sem cumprir o ritualismo previsto no Código de Processo Penal para a apreensão de documentos e para uma busca, é inconstitucional por violação do princípio do Estado de direito, do direito à integridade moral, à reserva da intimidade da vida privada, o princípio das garantias de defesa, o princípio da tutela jurisdicional dos atos instrutórios e de inquérito, inviolabilidade da correspondência, o princípio do processo equitativo e a dignidade da pessoa humana (cfr. artigos 1.º, 2.º, 3.º n.º 2, 18.º n.º 2, 25.º n.º 1, 26.º n.º 1, 32.º n.º 1, 4 e 8 e 34.º n.º l da Constituição da República Portuguesa e 6.º n.º 1 da CEDH). Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso julgando-se inconstitucional a interpretação do acórdão recorrido da interpretação das normas supra citadas, por violação das normas constitucionais e internacio- nais supra aludidas, ordenando ao tribunal recorrido que se conforme com o julgamento de inconstitucionalidade realizado, por só assim se fazer Justiça.» O Ministério Público apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: «1. Embora não expressamente consagrado na Constituição, o reconhecimento ao arguido, verdadeiro sujeito processual, do direito ao silêncio ( nemo tenetur se ipsum accusare ) encontra o seu fundamento imediato nas garan- tias de defesa constantes do artigo 32.º da Constituição e na exigência de um processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da CRP). 2. Tal direito, que é expressamente reconhecido no artigo 61.º, n.º 1, alínea d) do CPP, não é, naturalmente, absoluto. 3. No entanto, as restrições a esse direito só serão constitucionalmente admissíveis se estiverem previstas na lei e se mostrarem respeitadoras da proporcionalidade e da necessidade, atendendo à natureza dos conflitos em presença. 4. O dever de colaboração dos contribuintes com a administração fiscal, encontra guarida nos artigos 31.º e 59.º da Lei Geral Tributária (LGT). 5. No artigo 63.º da LGT (“Inspeção”) prevê-se a possibilidade de o órgão competente proceder à inspeção tributária, estando esta sujeita a um regime próprio e rigoroso, o Regime Complementar de Procedimento da Inspeção Tributária (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de dezembro, alterado e republicado pela Lei n.º 50/2005, de 30 de agosto). 6. O dever de colaboração e cooperação previsto na LGT e no Regime Complementar (artigos 9.º e 32.º) tem, contudo, os limites impostos por direitos constitucionalmente garantidos, cabendo aos tribunais dirimir eventuais conflitos (artigo 63.º, n.º 4, da LGT). 7. Com vista á satisfação de necessidades coletivas e para que possam ser cumpridos os deveres a que está cons- titucionalmente obrigado, o Estado tem de cobrar impostos, justificando constitucionalmente essa finalidade que o regime das infrações tributárias se afaste, em alguns aspetos,  do “regime comum”. 8. O procedimento da inspeção tributária visa a verificação do cumprimento das obrigações tributárias por parte dos sujeitos passíveis, enquanto o inquérito, nos termos do artigo 262.º do CPP, “compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher provas, em ordem à decisão sobre a acusação”. 9. Detetada no âmbito da inspeção uma infração fiscal, a possibilidade de os documentos facultados à admi- nistração fiscal no âmbito do dever de colaboração serem utilizados no inquérito, não viola o direito ao silêncio. 10. Efetivamente, mostrando-se respeitados, como mostra, os princípios da legalidade e da proporcionalidade, toda a prova pode ser contraditada, gozando o sujeito passivo (arguido) de todas as garantias que o processo penal lhe concede. 11. Nos termos do exposto, deve negar-se provimento ao recurso.»

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