TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
339 acórdão n.º 340/13 assim, o estatuto do arguido como autêntico sujeito processual. Na verdade, “só pode falar-se de um sujeito proces- sual, com legitimidade para intervir com eficácia conformadora sobre o processo, quando o arguido persiste, por força da sua liberdade e responsabilidade, senhor das suas declarações, decidindo à margem de toda a coerção sobre se e como quer pronunciar-se”. – Manuel da Costa Andrade, Sobre as proibições de prova em processo penal , Coimbra Editora, 1992, pp. 121 e 122. 14.ª Seguindo o mesmo autor, no plano constitucional não deve desatender-se o significado de um preceito como o artigo 32.º n.º 4, que prescreve a nulidade de “todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa à integridade física ou moral da pessoa (…)”. Pois, a não caírem sob a censura direta da tortura ou coação, as provas obtidas em contravenção do princípio nemo tenetur, configurarão um atentado à integridade moral da pessoa. E um atentado particularmente qualificado na medida em que redunda na degradação da pessoa em mero objeto ou ins- trumento contra si própria numa área onde cabe assegurar a expressão da plena liberdade e autorresponsabilidade." 15.ª O princípio da presunção da inocência envolve, o direito de não apresentar provas, qualquer tipo de pro- vas em qualquer suporte ou fase processual. 16.ª De facto, nos dizeres de Liliana Sá supra citada, os direitos do arguido a não prestar declarações sobre os factos que lhe são imputados e a não fornecer provas que o possam incriminar são uma dupla consequência do princípio da presunção da inocência, ou seja, é exatamente porque ele beneficia desta presunção (que determina a inversão do ónus da prova), devendo mesmo ser absolvido em caso de dúvida acerca da autoria da infração penal (é o conhecido princípio in dubio pro reo ), que o arguido não pode assumir a dupla veste de investigador e investigado. 17.ª Os métodos proibidos de prova estão previstos no artigo 126.º do CPP, o qual não refere expressamente o princípio da presunção da inocência. Todavia, a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) considera que ele se identifica com o princípio in dubio pro reo e constitui um dos fundamentos da proibição de obtenção de declarações comprometedoras através de meios irregulares de prova. 18.ª Para além do exposto, como se diz ainda no mesmo estudo de Liliana Sá, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem “(...) num acórdão que é considerado um marco no reconhecimento destes direitos a qualquer pessoa sob investigação, resultante do julgamento do processo Funke vs. France considerou ter sido violado o artigo 6.º n.º 1 do CEDH, na medida em que as características particulares da legislação aduaneira não justificam a violação do direito do arguido a permanecer em silêncio e a não contribuir para a sua incriminação. No entanto, Uma vez estabelecido que o direito a um processo justo, protegido pelo artigo 6.º, inclui no seu seio, embora não expres- samente, os direitos ao silêncio e à não autoincriminação, e porque, neste caso, estava em causa uma atuação das autoridades alfandegárias, foi preciso esperar pela resolução do processo denominado Bendenoun vs, France para que o TEDH se pronunciasse, afirmativamente, pela aplicabilidade desses princípios penais aos procedimentos fiscais.” 19.ª Todos os atos praticados pelos órgãos de polícia criminal em momento anterior à transmissão da noticia do crime ao MP não integram qualquer fase processual, uma vez que a decisão de abertura do processo, que se inicia com a fase de inquérito, pertence ao MP não se prevendo qualquer fase pré-processual. Tais atos apenas integrarão o processo após um ato decisório da autoridade judiciária, que, nesse momento assumirá a responsabilidade pelos mesmos. 20.ª Se assim não for, “(...) é a A.T. que, ao decidir do momento da comunicação ao MP da notícia do crime, decide do se e do quando da instauração do inquérito, que poderá ficar a cargo dos mesmos funcionários que interrogaram o contribuinte e lhe solicitaram elementos informativos, os quais irão ouvir de novo, aproveitando- -se eventualmente das informações obtidas e por ele prestadas, em violação das suas garantias de defesa. Por outro lado, podem os inspetores ser tentados a protelar a investigação administrativa, onde o contribuinte é obrigado a colaborar, por forma a diferir o uso dos direitos que lhe são reconhecidos no inquérito, procedimento que seria totalmente desconforme à Constituição.” 21.ª Para além das já citadas decisões do TEDH, Liliana da Silva Sá, no mesmo estudo refere ainda um outro, o “(...) caso Saunders vs United Kingdom – em que este órgão foi mais longe nas consequências que retira do artigo 6.º reconhecendo que a utilização em processo penal das provas (no caso, declarações) obtidas num processo
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