TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
32 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 26. Esta é uma conclusão que tem sido acolhida também pela generalidade da doutrina, como se con- firma pelas seguintes asserções: «O Estado não pode criar outras categorias ou tipos de autarquias locais, encontrando-se vinculado a respeitar um princípio da tipicidade quanto às categorias de tais entidades públi- cas» (P. Otero, “Direito Constitucional Português”, vol. II, in Organização do Poder Político , 2010, p. 621); «As categorias de autarquias locais são unicamente as de existência imposta ou consentida pela Constituição, o legislador não pode criar outras. É uma matéria de reserva da Constituição» (J. Miranda, “artigo 236.º”, in Constituição Portuguesa Anotada , R. Medeiros/J. Miranda coord., Tomo III, 2007, p. 450). No mesmo sen- tido se pronunciam Gomes Canotilho e Vital Moreira, referindo que «as categorias de autarquias referidas são um numerus clausus , não podendo ser criadas outras (princípio da tipicidade)» (J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. II, 2010, p. 720). Em sentido idêntico, Casalta Nabais refere que «não pode a lei (…) criar outros tipos de autarquias locais diversos dos constitucionalmente previstos, a saber: freguesias, municípios e regiões administrativas no Continente e freguesias e municípios nas Regiões Autónomas» (Casalta Nabais, “A autonomia local”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, pp. 159-161). 27. A única exceção aberta pela CRP ao numerus clausus das autarquias locais tipificadas no artigo 236.º, n. os 1 e 2, encontra-se prevista no n.º 3 do mesmo artigo, mas ainda assim, condicionada à verificação de alguns pressupostos. Na referida disposição, a Constituição concede ao legislador ordinário uma habilitação constitucional («a lei poderá estabelecer») para estabelecer «outras formas de organização territorial autár- quica». Esta exceção só vale, todavia, para as «grandes áreas urbanas» e as «ilhas» e «de acordo com as suas condições específicas». Ora, no que respeita às comunidades intermunicipais, do regime estabelecido no NRJAL e da sua ins- tituição pelo n.º 1 do artigo 2.º do Decreto n.º 132/XII (conjugado com os seus anexos II e III), resulta que estas entidades são criadas por lei como entidades obrigatórias em todo o território continental, e não apenas nas ilhas ou grandes áreas urbanas. O único limite imposto no diploma em apreciação à criação de comuni- dades intermunicipais encontra-se estabelecido no artigo 64.º, n.º 2, do NRJAL, ao referir que «não podem ser criadas entidades intermunicipais com um número de municípios inferior a cinco nem com população inferior a 85 000 habitantes». Residindo os pressupostos de criação das comunidades intermunicipais no número de municípios e habitantes, e não em critérios de insularidade ou dimensão da área urbana, o respetivo regime não pode, pois, encontrar habilitação constitucional no n.º 3 do artigo 236.º da CRP. 28. Nem se diga que, na medida em que são integradas por municípios, as comunidades intermunicipais assumem a configuração material de uma associação de municípios, i. e. , associações públicas constituídas por entidades públicas (os municípios), estando, portanto, a sua criação na disponibilidade da Assembleia da República [nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea s) , da CRP]. Não é esse o regime que decorre do NRJAL. Desde logo, porque o NRJAL prevê um novo regime do associativismo autárquico (Título V, artigos 120.º e segs. do NRJAL), distinto do regime das entidades intermunicipais (Título III, artigos 63.º e segs. do NRJAL). É do próprio regime estabelecido no diploma em análise que decorre, pois, o caráter não associativo das entidades intermunicipais. Por outro lado, a criação por lei e o caráter obrigatório da participação dos municípios nas entidades intermunicipais afasta-as inelutavelmente da caracterização como associações de municípios. A vontade dos municípios é irrelevante na constituição destas entidades. De facto, o artigo 253.º da Constituição habilita diretamente os municípios (não o legislador) a «constituir associações e federações para a administração de interesses comuns, às quais a lei pode conferir atribuições e competências próprias». Sem prejuízo da sujeição ao respetivo enquadramento legal, a constituição destas associações deverá traduzir sempre uma expressão da autonomia dos municípios se associarem para realização de interesses específicos comuns aos municípios associados, ou mais concretamente ainda, interesses coletivos partilhados entre as populações envolvidas.
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