TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
293 acórdão n.º 325/13 Como se referiu, na sentença recorrida foi decidido que o regime legal sobre o trabalho suplementar previsto no Decreto-Lei n.º 421/83, não tem aplicação às empresas públicas, isto porque, de acordo com o seu artigo 12, o legislador quis “que a sua aplicação ficasse dependente de publicação de portaria que estabelecesse as necessárias adaptações, face às características das empresas em causa”, com este entendimento vide o acórdão do STJ de 31 de março de 2004 (internet www.dgsi.pt ). Defende este acórdão que o Decreto-Lei n.º 421/83, não é aplicável às empresas concessionárias de serviços públicos, em virtude de nos termos do artigo 12 do mesmo diploma, a sua extensão a tais entidades ter ficado dependente da publicação de Portaria que estabeleceria as necessárias adaptações; mas como aquela não foi publi- cada, verifica-se uma ilegalidade da norma por omissão. No entanto, como já temos vindo a defender, designadamente no acórdão de 15 de dezembro de 2005, n.º 2287/05, (internet www.dgsi.pt ) , não pode uma Portaria vir definir o regime jurídico laboral no que diz res- peito à remuneração do trabalho suplementar, sob pena de violação o princípio constitucional do primado da lei e o princípio constitucional da primariedade ou precedência da lei sobre a actividade regulamentar, ou seja, a lei considerada imperativa ou com força constitucional prevalece sempre sobre qualquer regulamento que a minimize, derrogue, interprete deficientemente, etc. Todas as normas respeitantes ao salário “gozam de garantias especiais”, nos termos do artigo 59.º, n.º 3 da CRP, e a garantia dos salários decorre da lei geral, pelo que as leis sobre salários têm sempre aplicação, salvo se for estabelecido regime mais favorável para o trabalhador, pelos meios constitucionalmente admitidos. Em consequência, não se pode defender que o Decreto-Lei n.º 421/83, não tem aplicação e que existe um vazio legal, porque tal seria uma violação da garantia constitucional das normas relativas ao salário. Todavia, é, de facto, estranho que o legislador nunca tenha publicado tal Portaria, passados que foram 20 anos sobre a publicação da lei, provavelmente houve razões para nunca tenha sido publicada, designadamente a de se ter admitido que tal norma era inconstitucional. Vejamos então: A Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro, aditou o n.º 5 do 115.º da Constituição, que proibiu “a criação de actos legislativos através da Lei”, a corresponde actualmente ao n.º 6 do artigo 112.º, da Constituição. O Decreto-Lei n.º 421/83 foi publicado em 2 de dezembro, ou seja pouco mais de 1 ano após a revisão consti- tucional de 1982. O seu artigo 12.º, n.º 1, concede autorização para se criar por Portaria um regime jurídico para as empresas públicas. Afigura‑se assim que esta “deslegalização” de matérias jurídicas, com a criação de regimes especiais ou regulamentos através de actos que não assumem a forma de lei é inconstitucional, porque violadora do citado n.º 6 artigo 112.º, da CRP. Com decidiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão de 29/10/1985, publicado no Diário da República em 31 de dezembro de 1985 (em www.dgsi.pt ) , “Até à revisão constitucional de 1982 poderia entender-se que o Parla- mento ou o Executivo legislador, pudessem deslegalizar certas matérias que não devessem assumir, necessariamente, a forma de lei, por meio de regulamentos praeter ou até contra legem . O artigo 115.º, n.º 5 da Constituição, aditado pela Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro, eliminou, porém, a legitimidade de tais Regulamentos.” Neste acórdão foi declarada a inconstitucionalidade de um artigo, vertido num Decreto-lei, que permitia a vários ministérios, por Portaria, suspenderem por três meses a execução da própria lei. Nos presentes autos está em causa a suspensão da lei até à publicação de uma portaria, que por sua vez criará um regime jurídico diferente do previsto na própria lei, o que configura uma situação idêntica à tratada no citado Acórdão do Tribunal Constitucional. Assim sendo, torna-se compreensível que regime jurídico em causa “dependente de portaria” nunca tenha sido publicado já que a norma que o previa, artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 421/83, é inconstitucional. Mas, acresce que, a norma do n.º 2 do artigo 1.º, do Decreto-Lei n.º 409/71, para a qual remete o artigo 12 do Decreto-Lei n.º 421/83, já foi considerada como revogada. Na verdade, com a entrada em vigor do Decreto- -Lei n.º 260/76, de 8/4, que define ou consagra o Estatuto das Empresas Públicas (actualmente revogado pelo Decreto-Lei 558/99, de 17/12), tem de se considerar que foi revogado o n.º 2 do artigo 1.º, da LDT. Este é o entendimento de Liberal Fernandes que refere: “Assim, dado o princípio da lex posteriori derogat legís priori e o
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