TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

287 acórdão n.º 324/13 6. Dispondo a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, na redação de 2007, que “não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações que apliquem pena não privativa da liberdade” (itálico aditado), é de concluir que ultrapassa manifestamente o sentido possível das palavras da lei, saindo “fora do âmbito da interpretação”, a norma segundo a qual não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos, quando o tribunal de pri- meira instância tenha aplicado pena não privativa da liberdade (assim, Figueiredo Dias/Nuno Brandão, loc. cit. , pp. 635 e segs. e Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica, 2011, comentário ao artigo 400.º, ponto 14). E não pode alargar-se o âmbito da irrecorribilidade por referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º daquele Código, por a mesma ser estranha à matéria da recorribilidade das decisões, inserindo-se antes na matéria atinente à repartição de competências entre as Relações e o Supremo Tribunal de Justiça, dispondo especificamente sobre esta repartição relativamente a recursos interpostos de acórdãos do tribunal do júri e do tribunal coletivo, ou seja, de decisões finais de 1.ª instância, já que quanto a recurso interpostos de acórdãos das Relações estatui especificamente a alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo 432.º O artigo 400.º do CPP é a sede normativa própria da irrecorribilidade de decisões proferidas em segunda instância, numa pre- visão que constitui exceção ao princípio geral da recorribilidade dos acórdãos, das sentenças e dos despachos, estatuído no artigo 399.º do mesmo Código. O sentido textual da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º, na redação de 2007 – não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações, que apliquem pena não privativa da liberdade – “não permite de forma alguma abarcar qualquer extensão à pena de prisão efetiva, qualquer que seja a sua medida, superior ou não superior a 5 anos. Ora, quando o sentido inculcado a determinada norma legal não tem expressão, por mínima ou remota que seja, no texto normativo, a atividade judicativa correspondente sai fora do âmbito da interpretação e invade o campo da analogia”. No caso, revela-se da seguinte forma: “se não é admissível recurso direto da 1.ª Instância para o Supremo em caso de pena de prisão não superior a 5 anos então, por identidade ou até por maioria de razão, não deve ser também admissível recurso da Relação para o Supremo quando a pena de prisão não exceda os 5 anos” (Figueiredo Dias/Nuno Brandão, loc. cit ., pp. 636 e segs.). A norma que é objeto de apreciação cria uma exceção à regra da recorribilidade das decisões proferidas em segunda instância além das previstas no n.º 1 do artigo 400.º do CPP, na redação de 2007. Coloca o intérprete no âmbito da analogia constitucionalmente proibida, sendo indiferente que a norma encontrada fora da moldura semântica do texto seja constitucionalmente admissível e político-criminalmente defensável, uma vez que a liberdade dos cidadãos está acima das exigências do poder punitivo nas situações legalmente imprevistas. 7. É de concluir, pois, pela inconstitucionalidade da interpretação normativa resultante da conjugação das normas da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º e alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, na redação da Lei n.º 48/2007, segundo a qual é irrecorrível o acórdão proferido pelas Relações, em recurso, que aplique pena privativa da liberdade inferior a cinco anos, quando o tribunal de primeira instância tenha aplicado pena não privativa da liberdade, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da CRP). III – Decisão Em face do exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional a interpretação normativa resultante da conjugação das normas da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º e da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, segundo a qual é irrecorrível o acórdão proferido

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