TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

226 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Porém, tendo em vista tal objetivo, não se afigura, desde logo, idóneo que o agravamento da punição da violação do dever de facultar imediatamente o livro de reclamações seja colocado na exclusiva dependência da iniciativa de o utente ofendido chamar a polícia. Tal iniciativa não está necessariamente associada a um agravamento da infração já perpetrada. Aliás, se o chamamento da polícia é uma condição suficiente do agra- vamento da coima, não é, todavia, uma condição necessária do agravamento da infração. Com efeito, o utente pode requerer a presença da autoridade policial, logo que confrontado com a recusa do livro de reclamações: não tem de chamar o gerente ou outro responsável nem tem de dar conhecimento prévio da sua intenção. O agravamento da coima pode, por isso, ocorrer sem que da parte do fornecedor de bens ou prestador de serviços exista um qualquer outro comportamento, para além da infração já sancionada pelo artigo 9.º, n.º 1, alínea a) , do citado decreto-lei – a recusa inicial de facultar o livro de reclamações solicitado pelo utente.  Acresce que, nos termos da lei, o pressuposto de tal chamamento é a prática da infração (“quando o livro de reclamações não for imediatamente facultado ao utente” – artigo 3.º, n.º 4, do diploma em análise), pelo que, quando muito, a presença da autoridade policial pode contribuir para a remoção da recusa inicial de apresentação do livro de reclamações. E se esta ocorrer – sendo, portanto, facultado ao utente o exercício do seu direito de reclamação – justifica-se a ponderação de tal circunstância, devendo o quadro punitivo demarcar claramente as situações em que, apesar de tardiamente, o direito do consumidor ainda pode ser exercido, daquelas em que, mesmo após a intervenção da autoridade policial, a recusa de apresentação do livro de reclamações é mantida. O agravamento do limite mínimo da coima aplicável, em razão apenas da “ocorrência” consubstanciada no chamamento da autoridade policial por parte do utente ofendido, não per- mite diferenciar satisfatoriamente as duas situações. O agravamento do limite mínimo da coima aplicável estatuído no artigo 9.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setembro, não é, por outro lado, necessário para assegurar uma tutela mais eficaz do direito dos consumidores a formularem as suas reclamações no livro especialmente destinado para o efeito. Na verdade, abrangendo a moldura punitiva para a violação do dever de facultar imediatamente o livro de recla- mações prevista no artigo 9.º, n.º 1, alínea a) , a totalidade do agravamento da coima aplicável para a mesma infração consignado no n.º 3 do mesmo artigo, nada impede o julgador de, caso a caso, e fazendo aplicação da moldura mais ampla, graduar diferentemente a coima a aplicar em razão de: (i) o direito de reclamação ter sido assegurado, mesmo sem a presença da autoridade policial (por exemplo, em virtude de o gerente ou responsável entretanto ter acedido a fazê-lo); (ii) o mesmo direito ter sido assegurado apenas na sequência do chamamento da autoridade policial; ou (iii) mesmo após ter sido solicitada tal intervenção, nem assim o fornecedor de bens ou prestador de serviços ter permitido ao utente o exercício do seu direito de reclamação. 9. Quanto ao pedido de formulação de uma interpretação conforme, o mesmo deve considerar-se pre- judicado, em virtude de in casu o Tribunal Constitucional confirmar o juízo de inconstitucionalidade for- mulado pela decisão recorrida e, em consequência, uma eventual interpretação conforme da norma contida no artigo 9.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setembro, não poder ter qualquer efeito útil no processo base (cfr. o artigo 80.º, n.º 3, da LTC). III – Decisão Pelos fundamentos expostos, decide-se: Julgar inconstitucional, por violação do princípio de proporcionalidade consignado no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, a norma extraída do artigo 9.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setem- bro, na interpretação segundo a qual é aplicável a coima aí prevista – cujo limite mínimo para as pessoas coletivas é de e 15 000 – nos casos em que, não sendo o livro de reclamações imediatamente facultado ao utente, este requer a presença da autoridade policial e tal recusa é removida, acabando o livro de reclamações por ser facultado ao utente;

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