TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

219 acórdão n.º 312/13 E, com efeito, a ponderação acerca da inconstitucionalidade da norma ora em apreço não pode ser desligada da necessária ponderação dos valores constitucionais e dos bens fundamentais potencialmente em conflito, sendo admissível que o legislador procure obstar a uma eventual sucessão de meios processuais pós- -decisórios que possam comprometer o célere trânsito em julgado de uma decisão de mérito, já proferida. E, não pode deixar de registar-se que, nos presentes autos, a conduta do recorrente denota uma utilização reiterada de tais incidentes pós-decisórios, visto que foram apresentados pedidos de aclaração relativamente a todas as decisões tomadas pelo tribunal recorrido: o primeiro em relação ao acórdão condenatório que decidiu sobre o mérito da causa, o segundo relativo a despacho do Relator proferido em 1 de outubro de 2012, sobre o dever de pagamento de multa, e o terceiro sobre a própria decisão sobre o referido pedido de aclaração, proferida em 25 de outubro de 2012.  Ora, o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de apreciar uma questão idêntica, através do Acór- dão n.º 376/12, no qual disse que: «O regime previsto no artigo 720.º do Código de Processo Civil insere-se no âmbito do poder-dever do juiz de providenciar pelo andamento regular e célere do processo, obviando a expedientes impertinentes e dilatórios. Assim, não é logicamente compreensível a alegação de inconstitucionalidade do entendimento que preconiza a aplicabilidade do artigo 720.º do Código de Processo Civil, no âmbito do processo penal, por força do artigo 4.º do Código de Processo Penal. Aliás, os recorrentes – que expõem vários argumentos em defesa da tese oposta, em termos infraconstitucionais – não aduzem uma argumentação substantivamente densificada, no âmbito constitucional, que justifique mate- rialmente o juízo de inconstitucionalidade, reportado aos concretos parâmetros da Lei Fundamental, cuja violação é apenas simplisticamente alegada. Não se percebe em que medida a consagração de um mecanismo, tendente a obviar a comportamentos injus- tificadamente dilatórios das partes, belisca o direito de acesso ao Direito e aos tribunais, sendo manifesto que o artigo 20.º da Constituição, que expressamente consagra o direito a uma decisão “em prazo razoável”, não abarca, – poderá mesmo dizer-se que, logicamente, exclui – no seu âmbito de proteção, um direito a um uso abusivo do processo, com fins dilatórios, que corresponderia à negação do próprio conceito de processo justo e equitativo. Da mesma forma, não se compreende que a interpretação normativa posta em crise acarrete qualquer violação dos direitos de defesa do arguido, que não compreendem, logicamente, o reconhecimento de um direito a um uso abusivo do processo ou a expedientes meramente dilatórios.» O sentido fundamentador do referido aresto é de reiterar, na sua integralidade. Impõe-se, porém, abor- dar o problema da inconstitucionalidade do artigo 720.º do CPC, na perspetiva da admissibilidade da não audição prévia da parte que provoca o incidente processual dilatório que constitui causa da extração de tras- lado. Evidentemente, nenhum direito fundamental é absoluto ou irrestringível, sendo constitucionalmente autorizado que o legislador ordinário comprima (ou restrinja) o âmbito máximo de proteção de cada direito, liberdade e garantia (cfr. artigo 18.º, n.º 2, da CRP) – ou de direito análogo, como é o caso do direito ao processo equitativo (cfr. artigos 17.º e 20.º, n.º 4, da CRP) –, desde que ressalvado o respetivo “núcleo essen- cial” (cfr. artigo 18.º, n.º 3, da CRP). Ora, como é por demais evidente, a restrição do exercício ao contraditório visa acautelar outros valores fundamentais em presença, que a Lei Fundamental também consagra, tais como a celeridade na adminis- tração da Justiça e o respeito pela formação de caso julgado de modo a acautelar os direitos e interesses prosseguidos por sentenças penais condenatórias. Assim sendo, o emprego de sucessivos expedientes pro- cessuais pós-decisórios, designadamente, de pedidos de aclaração deduzidos contra decisões jurisdicionais objetivamente esclarecedoras e inequívocas não pode deixar de ser equacionado como um fator de demora processual que o legislador (e o intérprete) deve(m) procurar combater para defesa de outros direitos funda- mentais. Assim sendo, a admitir-se que uma decisão de extração de traslado e baixa imediata dos autos ao tribunal recorrido tivesse de ser, necessariamente, precedida de audição da parte que provocou o incidente

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=