TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
190 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL restante “modelo” europeu). É que é o mesmo, o fundamento dos sistemas que se esteiam apenas no direito judicial de exame da constitucionalidade de normas e o fundamento dos sistemas que, como o nosso, se esteiam, para além disso, na competência judicial para desaplicar normas que sejam contrárias à Consti- tuição. Ou dizendo de outro modo: a fundamentar o direito judicial de exame – que é o que existe nos restantes sistemas nacionais europeus, em que o juiz examina a norma, e coloca ao Tribunal Constitucional, a título prévio e incidental, a questão da sua constitucionalidade – está o mesmo princípio que fundamenta a competência judicial de rejeição da aplicação de uma norma, previsto pelo artigo 204.º da CRP, Jura novit curia: como o juiz conhece o Direito, sobre ele impende a obrigação de não aplicar normas inválidas, porque contrárias à Lei Fundamental. A obrigação poderá traduzir-se no exame da questão de constitucionalidade (com competência para a colocação da questão, a título prejudicial, ao Tribunal Constitucional),ou, mais fortemente, em competência para rejeitar a aplicação da norma, em decisão da qual caiba recurso para o Tribunal Constitucional; a sua razão de ser, porém, manter-se-á sempre a mesma. É essa razão de ser que justifica as particularidades do recurso que é interposto, para o Tribunal Cons- titucional, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, e que se traduzem, desde logo e nos casos de normas dotadas de superior dignidade hierárquica, na obrigatoriedade para o Ministério Público da sua interposição imediata (n.º 3 do artigo 280.º da CRP). Nada disto existe, como se sabe, nos recursos que são interpostos de decisões dos tribunais que apliquem nor- mas cuja constitucionalidade tenha sido arguida durante o processo [artigo 280.º, n.º 1, alínea b), e n.º 4]; assim sendo, as diferenças entre um e outro tipo de recursos (e as particularidades dos recursos de decisões de desaplicação) não devem ser negligenciadas, quando se tem que decidir sobre a questão da utilidade do seu conhecimento por parte do Tribunal. Simplesmente, tal não altera um dado fundamental, que aliás se mostra determinante para a resolução da questão que agora tem que decidir-se. O Tribunal Constitucional português é, nos processos de fiscaliza- ção concreta da constitucionalidade das normas, um tribunal de recurso. As decisões que proferir terão que produzir efeitos sobre a decisão recorrida, mantendo-a ou alterando-a. Caso seja impossível a alteração, ou inútil a manutenção, a decisão que o Tribunal profira sobre a questão de constitucionalidade, não produ- zindo efeitos nenhuns sobre a decisão recorrida, não será a própria de um tribunal de recurso. Tanto basta para que, se tal suceder, não possa o Tribunal conhecer do objeto do recurso. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide não conhecer do objeto do recurso. Sem custas. Lisboa, 28 de maio de 2013. – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – José da Cunha Barbosa – Maria de Fátima Mata-Mouros (vencida de acordo com a declaração junta) – Joaquim de Sousa Ribeiro (revendo posição anterior). DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida. Teria conhecido do recurso, pelas seguintes razões: A decisão recorrida julgou a impugnação judicial procedente com base numa pluralidade de funda- mentos. Com efeito, para além da inconstitucionalidade da norma desaplicada – objeto do presente recurso – , a improcedência da impugnação judicial fundou-se ainda na caducidade do direito à liquidação por referência ao ano de 2000 e na falta de audição da impugnante no âmbito do procedimento de liquidação.
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